Observador
“Lei dos Solos” arrasta-se desde 2015. Partidos e associações exigem respostas ao ministro do Ambiente
A existência de terrenos contaminados em Lisboa pode comprometer a reputação do país e ser um risco para a saúde pública das milhares de pessoas que vão visitar a cidade em 2023, alerta o PSD.
A denúncia é de Bruno Coimbra, deputado e coordenador do grupo parlamentar do PSD na comissão parlamentar de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território: se nada for feito até 2023, altura em que Lisboa deverá receber as Jornadas Mundiais da Juventude, milhares de jovens vão ficar concentrados em “terrenos altamente contaminados”, no Parque das Nações. “Estamos perante um problema grave de reputação mas, e sobretudo, de saúde pública”, sublinha.
A contaminação dos solos é há muito uma questão delicada naquela zona da cidade, onde chegou a funcionar uma refinaria muito anos antes de ser reabilitada para receber a Expo 98. As queixas sobre um intenso cheiro a químicos têm sido uma constante e, ainda em 2017, houve uma operação de descontaminação dos terrenos da zona do Parque das Nações. Dois anos depois, associações ambientalistas como a Zero classificaram a operação como uma “fraude” e largamente insatisfatória.
Em 2020, Miguel Amorim, engenheiro civil e morador no Parque das Nações, conduziu um estudo próprio, recolheu amostras e encontrou resíduos perigosos em valores bastante acima do recomendável — em locais onde estavam a ser construídos um hotel, prédios de habitação e até uma escola.
Não é sequer exemplo único na região da Grande Lisboa. Em Setúbal, nos terrenos do Vale da Rosa, foram quantificadas 80 mil toneladas de resíduos. Ainda em outubro do ano passado, Zero alertou para o risco de contaminação dos solos e águas subterrâneas com arsénio, substância considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como potencialmente cancerígena.
Os problemas não são exclusivos destas duas regiões, alerta o social-democrata Bruno Coimbra. O encerramento da refinaria de Matosinhos e da central termoelétrica da EDP em Sines, por exemplo, obrigará a intervenções de fundo para descontaminação de solos e de remoção de resíduos perigosos. Problema, segundo o PSD: não existe um enquadramento legal que permita uma intervenção mais decidida, a assunção de responsabilidades e a justa compensação pelos danos ambientais causados.
Uma lei enterrada desde 2015
“É muito mais bonito termos aí uma propaganda verde sobre o clima do que resolver questões que estão no subsolo e enterradas”, queixa-se ao Observador Bruno Coimbra.
Em causa, está um diploma que continua gaveta desde 2015, altura em que António Costa tomou posse como primeiro-ministro. O projeto legislativo — Prevenção da Contaminação e Remediação dos Solos (PRoSolos) ou a “Lei dos Solos” — pretendia fixar um regime jurídico para a prevenção da contaminação e tratamento dos solos, exigindo a avaliação da sua qualidade, bem como a responsabilização de quem contamina, assente nos princípios do poluidor-pagador e da responsabilidade.
Este diploma, exigido por vários partidos, do PSD à deputada independente Cristina Rodrigues (PAN), passando por associações ambientalistas como a Zero, conheceu uma versão preliminar ainda em novembro de 2015 mas nunca conheceu a luz do dia.
O antigo secretário de Estado do Ambiente Carlos Martins chegou a prometer que a legislação seria publicada até junho de 2016 e, mais tarde, comprometeu-se em tê-la pronta no ano de 2017. Nada feito.
No início de 2020, a atual secretária de Estado do Ambiente, Inês Costa, garantiu que o processo estaria concluído até final do verão desse ano. Acabou por não acontecer.
“Infelizmente, passados mais de cinco anos da tomada de posse do atual ministro do Ambiente, a novela à volta desta importante peça legislativa para proteção dos solos parece não ter fim à vista”, queixava-se a Zero ainda em dezembro de 2020.
Para os sociais-democratas, o tempo já se esgotou. “O Governo tem de explicar porque é que há seis anos não publica isto e tem de quebrar este silêncio sepulcral. Caso contrário, é uma questão de tempo até termos um problema grave de saúde pública”, remata Bruno Coimbra.