Diário de Notícias
Sustentabilidade exige indústrias de recuperação de materiais e o recurso a energias verdes. Custos da transição energética para as populações também devem ser ponderados.
O secretário de Estado do Ambiente, Emídio Sousa, disse, sexta-feira, em Vila Real, que já é tempo de se aproveitarem melhor os resíduos, que “ainda são vistos como lixo”, e de se passar da fase dos aterros sanitários para as “indústrias de recuperação de materiais”. A sustentabilidade do planeta agradece. O governante está a contar com as universidades para encontrar soluções para os resíduos. Entende que é neste campo que “entram as engenharias, sejam mecânicas, químicas ou outras, para se saber quais os melhores processos para recuperar os materiais incorporados nos produtos que passaram a ser resíduos”. É todo um “manancial de desenvolvimento e de criação de bons empregos”, prevê. E tudo isto é “desenvolvimento sustentável”, de acordo com Emídio Sousa, pois “quanto menos recursos tiverem de ser extraídos da natureza e quanto mais tempo durar o ciclo de vida do produto e do material, melhor”.
Esta política é inevitável, pois, segundo o secretário de Estado, “Portugal tem um gravíssimo problema na área dos resíduos”. Deve-se à “inércia do setor” e faz com que “dentro de dois anos o país não tenha onde os depositar”. No Norte, em particular, “a capacidade esgota-se dentro de meses”. Emídio Sousa encerrou o “Diálogo pela Sustentabilidade” promovido pelo MOODS – Movimento pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Foi lá que o diretor-executivo do Grupo Dourogás, Nuno Moreira, o desafiou a inaugurar um projeto-piloto “inovador e único em Portugal” que está a ser desenvolvido pela empresa no aterro sanitário de Urjais, em Mirandela. Consiste na produção de gás natural a partir da combinação de CO2 e hidrogénio. “É gás natural solar”, frisou o responsável.
Aquecimento global
A propósito do aquecimento global, Nuno Moreira acredita que “terá solução no dia em que tirar carbono, hidrogénio e oxigénio da atmosfera for um negócio”. Apesar de ainda “não ser economicamente viável”, tem de se “caminhar com esse objetivo”. O Grupo Dourogás vai, “muito rapidamente, deixar de ser uma empresa de combustíveis fósseis”. Atualmente, “100% do gás que vende é renovável” e tal só foi possível a partir do momento em que passou a ser um negócio. “De outra forma seria insustentável”.
Atualmente, continua empenhado no fornecimento de gás natural para alimentar os motores dos camiões e autocarros. Neste momento tem “80% da quota de mercado portuguesa”. A diferença em partículas libertadas é de “quase 95%” em relação ao combustível tradicional e “mais de 30% em poupança de CO2”. Por seu lado, o professor da UTAD Luís Ramos lembrou que um dos desafios que se coloca é “o financiamento dos custos adicionais que a transição energética representa”, nomeadamente na compra de viaturas elétricas. “A transição tem custos globais para os países e custos diretos para as famílias e estas não têm todas o mesmo poder de compra. Se é um desafio global, quem é que vai assumir os custos?”
O dilema sobre o lítio
O docente salientou que tem havido uma preocupação na Europa com esta questão. Mas em Portugal há uma “inquietação com a exploração de lítio e o impacto que ela vai ter”, embora seja “uma forma de substituir os combustíveis fósseis na produção de energia para a mobilidade”. Apesar disso, Luís Ramos lembrou que tem “impactos enormes no território, com custos elevados para as populações”, nomeadamente no Interior, onde já se exploram as energias hidráulica, eólica e solar. “Há necessidade de se ponderarem as vantagens e os inconvenientes das intervenções de grande escala, que podem pôr em causa o equilíbrio e a ocupação humana de um determinado espaço”, alertou.
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Emídio Gomes: “Temos de ser mais eficientes e cuidar do nosso planeta”
Reitor da UTAD, Emídio Gomes, destacou preocupação que já é levada a sério no campus.
O reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), Emídio Gomes, destacou que a academia sediada em Vila Real já é um “exemplo de sustentabilidade”. Não só pelo seu EcoCampus, mas por causada formação que já disponibiliza e por projetos futuros de renovação de instalações. Na abertura do “Diálogo pela sustentabilidade”, iniciativa do MOODS – Movimento pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que decorreu na UTAD, em Vila Real, Emídio Gomes destacou que eco campus foi “construído de raiz”. Lembrou mesmo os tempos em que “a mais antiga das árvores de hoje ainda não chegava ao joelho”. Hoje é um autêntico jardim botânico, considerado um dos maiores da Europa.
O reitor salientou ainda a formação na área do ambiente, dando como o exemplo o curso de licenciatura em Design Sustentável, e também referiu as obras previstas para breve na área da ciência animal. “O objetivo é o bem-estar nas nossas instalações”, explicou, lembrando que as atuais foram construídas há mais de quatro décadas, numa altura em que o tema da sustentabilidade ainda não era tão importante. Emídio Gomes notou que atualmente a construção já é feita com “materiais sustentáveis”, que visam a “eficiência energética e o bem-estar”. “Hoje tudo se integra neste domínio e muitos dos setores incluem Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”, insistiu o reitor, com uma mensagem final: “Temos de ser mais eficientes e cuidar do planeta, para lhe dar vida por muitas mais gerações”.
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Sustentabilidade tem apenas 16% das metas no rumo certo
Relatório de 2024 mostra que a esmagadora maioria dos objetivos tem progresso limitado ou uma reversão.
Durante a sessão de sexta-feira do “Diálogo pela Sustentabilidade”, na UTAD, a assessora da reitoria para a área do Ambiente, Cristina Matos, disse que, “em média, apenas 16% das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão no caminho certo para serem cumpridas globalmente até 2030”. Esta afirmação teve por base um relatório de 2024 das Nações Unidas, que também revela que “os restantes 84% mostram progresso limitado ou uma reversão”. De acordo com o mesmo documento, “o ritmo do progresso dos ODS varia significativamente entre os grupos de países”, pelo que “o desenvolvimento sustentável continua a ser um desafio de investimento de longo prazo”. Nesse sentido, “reformar a arquitetura financeira global é mais urgente do que nunca”, frisou Cristina Matos.
A também diretora do curso de licenciatura em Cidades Sustentáveis e Inteligentes, na UTAD, destacou que “os desafios globais exigem cooperação global” e que “as metas dos ODS relacionadas com os sistemas alimentares são particularmente desafiantes”. A responsável centrou ainda a mensagem na “importância de pensar globalmente e agir localmente”. O foco local tem vantagens, como a “participação da comunidade”, o que “aumenta a consciencialização e o compromisso com a sustentabilidade”. Ao mesmo tempo, “pode gerar resultados rápidos e tangíveis, motivando e envolvendo mais as pessoas”, o que faz com que estejam “mais preparadas para enfrentar desafios e crises ambientais”.