Água& Ambiente online 01/01/202520
19 Expo Conferência da Água0320
PAPERSU contemplam investimentos de 3700 milhões
Tarifas em alta podem crescer 8 vezes
Esgotamento dos aterros exige resposta
Novas licenças implicam desafios
Nova estratégia para a água
Um plano de ação para colmatar todas as necessidades
Especialistas convergem na visão que têm para o setor da água: são precisos investimentos, menos burocracia e mais capacidade de armazenamento
Ana Clara
Num contexto de cada vez maior escassez dos recursos hídricos, a estratégia ‘Água que Une’ é apresentada em janeiro de 2025 ao Governo. O objetivo passa por definir uma visão integrada para a gestão, armazenamento e distribuição eficiente da água, identificando soluções e fontes de financiamento. Foi este o mote do Painel II – ‘Uma nova estratégia para a água’, inserido no âmbito da 19ª Expo Conferência da Água, que decorreu a 28 e 29 de novembro, no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa, numa organização do Grupo About Media. António Carmona Rodrigues, Presidente do Conselho de Administração da AdP – Águas de Portugal e coordenador do Grupo de Trabalho ‘Agua que Une’, salientou que este é um plano que assenta numa “perspetiva multissetorial” e pretende “passar da contingência para a resiliência”. Em cima da mesa estão prioridades como a revisão do Plano Nacional da Água 2025-2035 e o Plano da Rega, com o objetivo de dar resposta às fragilidades que algumas regiões do país “têm vindo a sentir com mais intensidade e frequência”.
Carmona Rodrigues assumiu que há desafios em vários setores, com destaque para a agricultura, com 70% de utilização, mas também no setor urbano “que necessita de avultados investimentos”. “No Algarve, vamos duplicar o número de origens de água (além das tradicionais, superficiais e subterrâneas) com a dessalinizadora. E com o crescente recurso às águas para reutilização passamos a ter quatro origens de água diferenciadas, que vão permitir uma maior flexibilidade na gestão e distribuição de água, com uma resiliência maior para fazer face às diferentes situações de disponibilidade no setor das águas superficiais”, afirmou. O presidente do Grupo AdP alertou para a necessidade de a conceção dos sistemas ter de se adaptar à nova realidade das alterações climáticas”. Por essa razão, realçou que, na AdP, as águas para reutilização s uma prioridade: “temos um plano de ação para os próximos anos para colmatar todas as necessidades”.
Carmona Rodrigues aludiu ainda ao “feliz exemplo” que temos em Portugal, o Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva, “que ao longo dos anos tem vindo a demonstrar a vantagem de haver uma infraestruturação com ligações entre várias barragens, com uma disponibilidade muito grande. Depois tem a vantagem de ser de fins múltiplos, para uso doméstico, industrial, agrícola, controle de cheias e garantia de conservação dos ecossistemas”. Sobre o financiamento, considerou ser fundamental caminhar para um “quadro de normalização e igualdade tarifária em todo o país”, reconhecendo que “há ainda grandes disparidades”. Neste ponto, anunciou que o Grupo AdP vai firmar um protocolo com a Associação de Municípios Portugueses (ANMP) no apoio técnico a todos os municípios de forma a gerirem bem as suas redes e as perdas.
“Transformar ambição em obra”
O setor agrícola é o maior utilizador de água do país, consome 4 mil milhões de metros cúbicos para regar cerca de 560 mil hectares (metade públicos e metade privados), representando 15% da área utilizada. Com este mote, Rodrigo Proença de Oliveira, professor no Instituto Superior Técnico e moderador da sessão, lançou o debate com Gonçalo Santos Andrade, vice-presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP). O responsável vê com bons olhos a iniciativa ‘Água que Une’ e espera que, “de uma vez por todas, se transforme a ambição em obra”. Relembrou que a CAP defende, há muito, uma rede nacional da água, “porque acreditamos que não temos falta de água, precisamos sim de uma gestão adequada dos recursos hídricos e trazer água onde ela existe em maior quantidade para locais onde é escassa”. E como conseguem os agricultores contornar este desafio? “Com agricultura de precisão, um equilíbrio adequado entre a sustentabilidade ambiental, social e económica”, disse.
Para o vice-presidente da CAP, também agricultor no setor dos pequenos frutos, “o país tem de fazer escolhas, e espero que com a ‘Água que Une’ venham finalmente obras de modernização e revitalização de perímetros de rega, muitos deles com mais de 50 anos”. Não tem dúvidas de que “a agricultura inovadora precisa de água. Mas se queremos ser competitivos no mercado global, temos de apoiar a produção, obra e investimento em termos de gestão e reservas de água. É importante que surjam as interligações, porque temos de trazer água do Norte para o Sul”.
Joaquim Poças Martins, professor universitário e consultor internacional no setor da água, partilha da opinião dos colegas de painel: a estratégia ‘Água que Une’ “é necessária, os atuais planos que temos são excelentes, mas não são suficientes para tomada de decisão”. “Em 2024, há coisas que estão facilitadas, uma área que temos resolvida é o abastecimento de água e saneamento”, constatou. Contudo, “a segurança física preocupa-me, nomeadamente as cheias e inundações. E, por isso, planear é fundamental”. Desta forma, Poças Martins considera que é sobretudo na agricultura que “se vai agir”, já que é um setor “muito importante para o país”. Ao invés de investimentos, o professor prefere falar em sustentabilidade. “A água é escassa, mas o dinheiro também. Quanto às obras, está tudo muito mais claro. Diria que barragens e transvases para abastecimento público não são necessários.
O setor agrícola é que vai ter de justificar os investimentos previstos, e é importante fazer este debate em Portugal, para que saibamos onde vamos investir, o que fazemos e artificializando como”, antecipa. Onde Portugal se pode unir, refere o professor universitário, é na reutilização. “Temos em Portugal 600 milhões de metros cúbicos de água que estão totalmente desaproveitados, falo da nossa água residual tratada”, lembra, acrescentando que “muitas coisas se podem fazer sem subsídios”, nomeadamente no setor do abastecimento público. Isso pode ser feito “com o apoio do setor privado e atuando nos 20% de ineficiência que temos”.
“É essencial continuar a apostar no armazenamento”
Outra das oradoras do painel ‘Uma nova estratégia para a água” foi Joana Freitas, Executive Board Member na EDP Generation, que destacou a importância do papel da água para a descarbonização. “Portugal tem a felicidade de ter recursos hídricos abundantes, adequados à produção hidroelétrica e isso permitiu ao país ser pioneiro na descarbonização do seu sistema elétrico”, disse. Porém, vamos “continuar a precisar de investir em hidroeletricidade, em particular em armazenamento, para chegar à neutralidade carbónica”. Joana Freitas lembrou que, atualmente, a hidroeletricidade representa cerca de metade da capacidade instalada renovável em Portugal, ou seja, 40% da capacidade total, e tem algumas caraterísticas particulares. “Primeiro, é altamente eficiente, com rácios de 90% de eficiência (entre energia produzida e energia utilizada) que compara com 60% das centrais a gás e 30 a 40% das centrais eólicas. Depois, é uma energia limpa, e dada a longa duração das centrais hídricas, é a que menos emite gases com efeito de estufa por unidade de energia consumida”, avançou. Além disso, vincou, “Portugal tem um parque instalado relevante”, sendo que “continua a ser importante criar condições para investir no armazenamento hídrico”. E avisou que a remuneração da energia hídrica corresponde ao valor que ela traz ao mercado. “Valor que excede, em muito, o preço cobrado no mercado diário de energia”.
Na opinião de Joana Freitas, “é essencial que a bombagem receba o mesmo tipo de ajudas que outras tecnologias de armazenamento”. Quanto a investimentos, e à medida que o mix energético vai integrando mais energias, em particular a solar, “a necessidade de armazenamento vai-se tornando fundamental para a estabilidade do sistema. E as condições para esses investimentos existem”, assegurou Joana Freitas, lembrando a ambição do Plano Nacional Energia e Clima (PNEC 2030) na bombagem hídrica (em 300 MW entre 2025 e 2030). “Num horizonte mais alargado, 10 a 15 anos, o mercado português precisa e pode incorporar uma capacidade de armazenamento hídrica maior, na ordem do 1 GW”. Como? Aproveitando as centrais hídricas existentes e dotando-as de capacidade de bombagem, acrescentou, sublinhando que “isso traz várias vantagens, como a rapidez no processo, porque não se está a construir de raiz, tem menor impacto ambiental e pode aproveitar as ligações à rede de transmissão das centrais hídricas existentes”. Joana Freitas concluiu, dizendo que “é importante que haja condições para que estes investimentos aconteçam e que o licenciamento destes projetos acompanhe essa necessidade” e não tem dúvidas de que “o investimento na bombagem hídrica permite-nos ter um sistema elétrico mais resiliente”.
—–
ADP vai continuar aposta na inovação que já fez da água do mar e das ETAR
Novos recursos
Carmona rodrigues, que desde maio preside ao conselho de administração da Águas de Portugal, revelou que há projetos a avançar por todo o país que resultam do reconhecimento da qualidade do grupo.
Zulay Costa
A aposta da Águas de Portugal (AdP) na inovação capacitou o grupo para avançar com projetos que fazem da água do mar e da água residual tratada recursos que já começam a ser utilizados no país, assegurou António Carmona Rodrigues, presidente do Conselho de Administração, garantindo que este é um caminho que terá continuidade. Carmona Rodrigues, que falava durante a sessão “Águas de Portugal: perspetivas para o futuro”, na 19ª Expo Conferência da Água, assegurou que a aposta do grupo “na capacitação profissional e na inovação” tem dado frutos. Sinal disso é o facto de haver “empresas a utilizarem a inteligência artificial para apoio à gestão da distribuição de água em alta no Norte”. Outro exemplo é a utilização da água para reutilização (água residual tratada), pois já há “capacidade de conhecimento que permite alavancar essa nova área importante de recurso hídrico para diferentes utilizações”. Segundo revelou, pretende-se avançar com projetos a curto prazo em Lisboa, expandir a utilização no Algarve dos campos de golfe para a agricultura e, também, tentar responder a “solicitações do lado da indústria”. Carmona Rodrigues adiantou que, nesta matéria, é preciso que haja “densificação da legislação” e “inclusão destes projetos, de forma integrada, noutros projetos de desenvolvimento territorial”. A utilização da água do mar é outro aspeto ao qual a AdP tem estado atenta. Por um lado, a dessalinizadora do Algarve já tem visto do Tribunal de Contas e está tudo encaminhado para as obras avançarem.
Por outro, a água do mar está a ser vista pela indústria como uma opção para ações de arrefecimento. “A curto prazo, em Sines, também vamos ter esse desafio de utilização direta de água de mar”, um novo desafio que vem no seguimento “da estratégia de afirmação do grupo como entidade concessionária para fornecimento de água, seja ela qual for, tanto para o setor urbano como industrial”, sublinhou Carmona Rodrigues. Segundo o administrador, este é um setor que requer investimentos avultados, seja em obras novas ou na reabilitação e expansão de sistemas. “No grupo, até 2032, estão previstos cerca de 2000 milhões de euros de investimentos”, que serão feitos com recurso, sobretudo, ao Banco
__
Europeu de Investimento, mas também a capitais próprios e alguns fundos, como o PRR. Ainda em matéria de inovação, Carmona Rodrigues considerou que a instalação em Portugal de uma Knowledge and Innovation Community (K/C), ou seja, uma Comunidade de Conhecimento e Inovação, neste caso no domínio da água, seria de especial importância, uma vez que a iniciativa europeia está envolta em inovação de ponta para responder a desafios emergentes. “Chamarmos a Portugal a localização de um destes centros é muito importante, não só para nós, mas para Portugal”, daí ser necessário que se perfilem um conjunto de entidades, públicas e privadas, que apostam na inovação e estão atentas à incorporação de tecnologia. “Estamos a falar de números grandes de investimento a longo prazo”, por parte da União Europeia”, para que se constituam núcleos de especialização tecnológica que tenham continuidade.
Selecionar onde investir para reduzir risco
Para desenvolver projetos a nível internacional com segurança, numa altura em que vários países enfrentam situações bélicas e confrontos, a AdP tem procurado “pescar à linha”, ou seja, selecionar bem onde investe. O grupo tem uma nova intervenção em Bali, na Indonésia, onde ajuda a criar um novo modelo de gestão. E, em breve, conta assinar um contrato com uma empresa na Tunísia, com vista à exploração da maior ETAR de Tunes, a capital. Segundo o administrador, ainda que em alguns países africanos haja instabilidade, os do norte podem ser “mercados interessantes” e têm mostrado uma “grande disponibilidade e apetência para colaborar com países como Portugal”, por reconhecerem “o sucesso das nossas empresas e do que temos vindo a fazer no setor”.
Depois de questionado pela plateia sobre os prejuízos que a internacionalização da AdP tem representado nas contas de cada ano, Carmona Rodrigues acrescentou que, além da vertente de negócio, a internacionalização deste grupo público serve, também, como “braço armado do Governo para a cooperação”, no seguimento da estratégia política do país. No que aos negócios diz respeito, há oportunidades que são apresentadas pelo Banco Mundial que podem condicionar as parcerias estabelecidas, como aconteceu no caso da Tunísia, mas, sempre que possível, contam envolver empresas portuguesas.
Ao longo dos últimos 30 anos, muito se progrediu em Portugal no setor da água, sobretudo no fornecimento em quantidade e em qualidade. Depois da fase qualitativa, “em muitos casos tem-se passado para a fase de excelência”, acrescentou Carmona Rodrigues, realçando que, atualmente, já estão em debate questões como a retirada de microplásticos da água e uso de ultravioletas para desinfeção. O grupo enfrenta “limitações, não apenas financeiras, mas também a nível de recursos humanos e técnicos”, apesar de serem notórios os progressos na capacitação e formação de pessoas no setor. De acordo com Carmona Rodrigues, a AdP tem procurado dar mais “estabilidade ao setor”, Articulando as várias empresas operacionais que integram o grupo e a relação com entidades como a Agência Portuguesa do Ambiente d a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos. Nesta altura, é preciso, também, “um quadro de estabilidade nos próprios municípios relativamente à gestão de infraestruturas e definição de tarifas”.
—–
Regulação económica pode ajudar a equilibrar setor desigual
Regulação económica e uma gestão empresarial podem contribuir para aumentar a sustentabilidade do setor e promover a convergência tarifária. Tarifa única pode ser possível na alta, mas será inviável na baixa.
Joana Filipe
O reduzido nível de recuperação de custos nos serviços de água é um problema persistente, que contribui para a falta de investimento na reabilitação das redes e dificulta a implementação do plano estratégico setorial (PENSAARP 2030), que perspetiva investimentos de 5,5 mil milhões de euros até final da década. A regulação económica da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) e uma gestão mais empresarial destes serviços podem contribuir para uma maior sustentabilidade do setor, defenderam os participantes no painel “Financiar a gestão da água sob um novo paradigma”, moderado por Jaime Melo Baptista, Conselheiro Estratégico da LIS-Water, que se realizou no passado dia 29 de novembro, no âmbito da 19ª Expo Conferência da Água. Já a possibilidade de se chegar a um preço único na água é menos consensual. “Temos um país a duas velocidades”, resumiu Joaquim Barreiros, vogal do conselho de administração da ERSAR, na abertura da sessão.
Se, em termos globais, o grau de recuperação de custos no país se aproxima dos 100%, como é exigido, “o desvio do padrão nas diferentes entidades gestoras é enormíssimo”. No abastecimento de água, mais de 45% das entidades gestoras não asseguram a recuperação de custos, enquanto no saneamento de águas residuais, esta situação abrange cerca de 60% das entidades. Além disso, acrescentou, 12% das entidades gestoras “não reporta informação fiável” ao regulador, o que é “preocupante”. Já os preços atuais praticados atualmente na baixa são “aceitáveis”, assegurando níveis de acessibilidade económica “muito bons”, mas “muito baixos” quando comparados com os de outros países. “Este é o panorama de cobertura de gastos: há imensa desigualdade”, resumiu, mas também “margem de melhoria, dado o nível de preços”.
As consequências deste panorama são várias, incluindo, desde logo, a “não geração de cash flows internos” na gestão da operação, elencou Joaquim Barreiros, o que também redunda em “dificuldades de obtenção de financiamento externo”. A redução do investimento continuado na reabilitação das infraestruturas é um dos efeitos secundários da falta de sustentabilidade das entidades gestoras do setor. Os atuais níveis de reabilitação de condutas e coletores no país são “particularmente desanimadores”, admitiu o responsável da ERSAR: 0,5% em termos médios, quando o regulador recomenda um valor anual de 2% do total da rede de distribuição.
“O principal problema [do setor] é a falta de sustentabilidade financeira”, analisou o Presidente da Associação das Empresas Portuguesas do Setor do Ambiente (AEPSA), Eduardo Marques, que encontra na origem deste cenário duas razões principais: “ineficiência de gestão” e “tarifas insustentáveis, politicamente condicionadas”. “É preciso cumprir a lei, o princípio do utilizador/ pagador”, instou e isto implica a atualização dos tarifários hoje praticados. O próprio PENSAARP 2030 aponta nesse sentido, estimando a necessidade de uma subida média dos preços “da ordem dos 50%”. “É preciso aumentar tarifas”, sintetizou. Por outro lado, para Eduardo Marques, a melhor maneira de ter um índice de cobertura de custos “sustentável” será apostar numa “gestão empresarial” deste serviço, porque esta assenta em “modelos económicos” de médio e longo prazo.
Segundo Rui Cunha Marques, é nas entidades que atuam em modelo de gestão direta que estão os maiores problemas e existe maior nível de subsidiação por via dos orçamentos municipais, enquanto nas entidades de cariz “mais empresarial” se garante a recuperação de custos por via tarifária. “É um tema sensível”, reconheceu, “não conseguimos mudar a mentalidade dos autarcas num curto espaço de tempo”.
No entanto, o professor no Instituto Superior Técnico propôs que se comece por melhorar a informação e comunicação nesta área, “sobretudo evidenciar que não há almoços grátis, alguém vai ter sempre de pagar a conta”, lembrou, e um município que canaliza dinheiro dos orçamentos municipais para subsidiar os serviços de água “está a penalizar outras áreas de serviço público e da sua atividade”. Por outro lado, “deve-se recuperar custos, mas custos eficientes”, frisou ainda, defendendo, por exemplo, que a tarifa de uma entidade gestora com 50% de perdas não deve ser paga na totalidade pelos utilizadores. “Isto deve ser equacionado pelo regulador em termos futuros”, disse.
Para Diogo Faria de Oliveira, administrador da Defining Future Options, o desafio de sustentabilidade do setor não se esgota na recuperação de custos por via tarifária. Segundo as contas que apresentou, do total de rendimentos tarifários gerados (844 milhões de euros) no serviço de abastecimento, 40% respeitam apenas às dez entidades de maior dimensão, enquanto as restantes 214 entidades cobram apenas 60% deste valor global. Isto significa que a média de faturação das 10 entidades de maior dimensão ronda os 34 milhões de euros, enquanto nas restantes 214 entidades, o valor médio faturado não vai além dos 2,4 milhões, e em 78 destas é mesmo inferior a 1 milhão de euros. Ou seja, mesmo que todas as entidades assegurem a cobertura dos gastos incorridos na prestação do serviço e garantam uma margem de dez por cento, “10% de 1 milhão não é nada, não chega para fazer investimento”. “Canhar escala” é, por isso, o primeiro passo para ultrapassar estas dificuldades, defendeu o consultor. Por outro lado, no modelo de gestão direta, não existem “planos de gestão”, a médio prazo, acrescentou, o que representa “uma limitação enorme” à capacidade de as entidades gerirem adequadamente a prestação deste serviço. “A empresarialização é mesmo precisa”, garante.
Preço único possível na Alta
O atual Governo já admitiu que tem no horizonte a possibilidade de criar uma tarifa única regulada para a água a nível nacional, mas esta hipótese não colheu entusiasmo entre os oradores do painel.
Questionado sobre as oportunidades de se promover um maior equilíbrio tarifário em alta ou em baixa, Joaquim Barreiros admitiu ainda ter dúvidas sobre o que se pretende com uma “tarifa única” na água, ou seja, se esta irá “abarcar a totalidade do setor ou apenas a alta”. Na sua perspetiva, no serviço em alta, “as condições existem” para que tal aconteça, observou, ainda que esta “uniformização” tenha de ser feita de forma “gradual”, uma vez que “levaria a aumentos muito significativos em algumas entidades gestoras e a diminuições também significativas noutras”. Já na vertente em baixa, “a situação é totalmente diferente” e “os obstáculos são mais que muitos”, até porque “há uma grande variedade de situações”. Neste âmbito, “o processo é muito difícil”, vaticinou, “o caminho há de ser muito longo e há coisas mais urgentes”.
“Há qualquer coisa que está mal”, quando 75% do orçamento de uma entidade gestora se destina “a cobrir os custos da alta”, realçou Eduardo Marques, que estima ser isso que acontece, atualmente, em termos médios, nas entidades servidas pelo grupo Águas de Portugal. “Uniformizar tarifas em alta poderá ser possível”, admite, “mas não faz sentido e terá uma repercussão significativa em muitas entidades em baixa” e, por isso, o assunto deverá “ser ponderado com cuidado”. Já na vertente em baixa é “totalmente utópico” haver uma tarifa única no país, porque “ninguém está disposto a pagar a ineficiência do vizinho do lado” e existe “autonomia municipal” nesta área, acrescentou.
“Temos sistemas em alta que são um êxito e outros que não têm os melhores resultados” avaliou Rui Cunha Marques, que sublinhou o impacto de “fatores de contexto” neste desempenho, incluindo, por exemplo, a densidade populacional e a extensão da rede. “Este sistema é difícil de harmonizar”, comentou e “políticas interventivas de criar sistemas que economicamente não se justificam dão maus resultados a longo prazo”. No entanto, o especialista identifica oportunidades de melhoria, nomeadamente na regulação dos sistemas em alta, que poderia ser baseada em “limites de preço” e na fixação de “incentivos à eficiência” para “promover melhores resultados”.
Regulação económica pode levar a convergência tarifária
Mas se a imposição de um preço único não convence, os efeitos da regulação económica, quer na recuperação de custos, quer na convergência tarifária, foram apontados pelos oradores. Diogo Faria de Oliveira guarda expetativas elevadas para a aplicação do decreto-lei 77/2024 de 23 de outubro, que veio repor as competências de regulação económica da ERSAR. “Vai haver um regulamento tarifário, que vai introduzir regras” comuns, salientou, nomeadamente para a definição e atualização das tarifas municipais, e isso deverá contribuir para uma maior “homogeneização” dos tarifários praticados de norte a sul do país. “Esta é a grande virtude do regulamento tarifário”, garantiu, que “só peca por tardio”. “É através destas regras que vamos conseguir esta convergência”, antecipa. “É efetivamente muito importante que a ERSAR volte a ter o seu estatuto em pleno na regulação económica”, disse também Eduardo Marques, que espera que, por esta via, se atinja um nível superior de cobertura de custos.
Joaquim Barreiros reconheceu igualmente a importância da recuperação pelo regulador de poderes na área económica e garantiu que a ERSAR “está preparada” para isso. Contudo, “falta-nos ainda a aprovação de um regime sancionatório”, referiu, “para dar total eficácia a este processo”. Também Rui Cunha Marques considera “fundamental” a implementação de um regime sancionatório. “Melhorava substancialmente a performance das entidades gestoras”, confia, dado existir no setor “um problema de enforcement”.
—–
Futuro das concessões depende de inovação, concorrência justa e parcerias público-privadas
O futuro das concessões municipais de serviços de água em Portugal exige inovação colaboração público-privada e reformas regulatórias para superar barreiras e assegurar sustentabilidade. Especialistas destacaram a necessidade de investimentos privados, maior equilíbrio concorrencial e políticas consistentes para dinamizar o setor
Marta Clemente
A 19ª Expo Conferência da Água trouxe para debate as questões mais prementes sobre a concorrência e os desafios do setor da água em Portugal. O painel “Potenciar a Concorrência” reuniu especialistas e representantes de entidades públicas e privadas, que discutiram soluções para dinamizar este mercado fundamental. Moderado por Diogo Faria de Oliveira, administrador da Defining Future Options, o painel contou com os oradores Pedro Perdigão, CEO da Indaqua; Altino Conceição, Diretor de Apoio a Empresas Participadas na ACS – Administração e Gestão de Sistemas de Salubridade; Miguel Moura e Silva, Vogal do Conselho de Administração na Autoridade da Concorrência (AdC); e Frederico Fernandes, co-CEO da Be Water. A discussão colocou em perspetiva pontos como o enquadramento legal, a matriz de risco das concessões e o papel do financiamento privado no setor.
O panorama atual das concessões
Diogo Faria de Oliveira iniciou a mesa-redonda contextualizando a evolução das concessões de água em Portugal. “Até 2009, os critérios para adjudicação de concessões priorizavam a tarifa [mais baixa], que valia 70% na decisão”. Isto incentivou um grande número de concessões, afirmou. Contudo, a legislação sofreu alterações com o Decreto-Lei n.° 194/2009, de 20 de agosto, que introduziu o conceito de “proveito tarifário mínimo garantido”, transferindo o risco financeiro das concessões para os municípios, ao garantir aos privados um nível mínimo de receitas, independentemente das tarifas cobradas. Essa mudança desincentivou os municípios a lançar novas concessões, devido ao impacto potencial nos seus orçamentos, uma vez que, abaixo do valor garantido, o município era obrigado a suportar os custos.
Isso “retirou risco ao privado”, resultando numa quebra significativa no lançamento de novas concessões. Lançado o mote inicial, Pedro Perdigão, o primeiro orador a intervir, apontou que “as exigências de amortização total dos investimentos no período da concessão” dificultam a sustentabilidade financeira do modelo. O CEO da Indaqua sugeriu que a transferência de ativos, como ocorre no setor elétrico, poderia equilibrar os custos e atrair maior interesse dos municípios. Ainda de acordo com Pedro Perdigão, o problema que tem afastado os municípios de lançar concessões não está na legislação, mas antes em três fatores principais. O POSEUR – Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos, que exclui concessões privadas e obriga a refletir subsídios nas tarifas — prejudicando os municípios com concessões.
O Fundo Ambiental, cuja fórmula de cálculo da Taxa de Recursos Hídricos (TRH), à qual se acrescentou um componente de sustentabilidade que obriga regiões não beneficiadas a subsidiar outras, redistribuindo custos entre regiões de forma controversa. E, por fim, o défice tarifário na baixa da Águas de Portugal, que limita a aplicação de tarifas mais baixas, tornando parcerias público–privadas mais apelativas para as autarquias do que as concessões tradicionais. Os desafios de financiamento também foram abordados neste contexto. Pedro Perdigão enfatizou que os elevados custos de investimento, especialmente em infraestruturas de longa duração, tornam os contratos de concessão menos atraentes para muitos municípios. Segundo o representante da Indaqua, “as tarifas são inflacionadas devido à necessidade de amortizar todos os investimentos no prazo da concessão”, o que dificulta o equilíbrio financeiro.
Por sua vez, Frederico Fernandes, da Be Water, salientou que, apesar das dificuldades, “a concorrência existe” e há players dispostos a atuar no mercado. “O que não há é um mercado”, argumentou, devido às barreiras de entradas de novos players e à “inelasticidade na compra da água”, dependendo o “dinamismo do setor da concorrência dos fornecedores”. Altino Conceição foi ainda mais longe: “Para podermos falar de concorrência, tem de existir um mercado. E, hoje em dia, é muito difícil dizermos que existe um mercado quando os operadores, ou melhor, os diversos modelos de gestão não têm as mesmas armas para estar neste mercado”, disse.
Frederico Fernandes sublinhou que o setor enfrenta um desequilíbrio concorrencial entre os modelos de gestão direta, concessões e empresas municipais. “A gestão direta é muitas vezes imitada pela falta de estrutura e profissionalismo, criando desigualdades significativas no mercado”. No que respeita às agregações, Frederico” Fernandes indagou; é interessante analisar se o sucesso alcançado nas agregações se deve à escala criada ou à transição para uma gestão integrada e dedicada, apoiada por uma estrutura organizada, pública ou privada, que trouxe maior transparência através de metas e indicadores claros.
Barreiras e soluções para a concorrência
Uma das principais barreiras identificadas pelo painel foi o acesso desigual aos fundos públicos. Como já referido, Pedro Perdigão mencionou que o POSEUR e o Fundo Ambiental favorecem entidades públicas, excluindo frequentemente as concessões privadas, penalizando as tarifas e os municípios que optam por este modelo. Altino Conceição corroborou este ponto de vista: “Os operadores privados enfrentam desvantagens fiscais e de financiamento, o que dificulta a criação de um mercado equitativo.” O Diretor de Apoio a Empresas Participadas na ACS sugeriu, assim, a necessidade de reformar a legislação para garantir igualdade de condições entre os diferentes modelos de gestão.
Frederico Fernandes comentou que o desequilíbrio fiscal também prejudica os operadores privados, explicando que as tarifas praticadas pelas concessões privadas precisam de refletir os custos totais de operação e manutenção, enquanto os sistemas geridos diretamente pelos municípios muitas vezes recebem subsídios que não são contabilizados de forma transparente. Para Miguel Moura e Silva, o problema não é apenas regulatório. É fundamental “dinamizar instrumentos de concorrência pelo mercado”, garantindo acesso adequado à informação e uma “partilha equilibrada de riscos nos contratos”, declarou, complementando ainda: “depois, sempre que possível, naturalmente, uma abertura ao mercado e um modelo regulatório que seja pró-competitivo e com incentivos à eficiência dinâmica”.
O vogal na AdC também defendeu a neutralidade do Estado na atribuição de subsídios, para não prejudicar os operadores privados. Outro aspeto levantado foi a necessidade de melhorar a qualidade da regulação. Altino Conceição realçou que “a falta de clareza nos contratos e a burocracia excessiva dificultam o funcionamento eficiente do setor”, sugerindo que os contratos de concessão fossem estruturados para incluir cláusulas mais equilibradas entre risco e retorno.
O impacto da política no setor
O alerta para o impacto da instabilidade política nas concessões partiu de Frederico Fernandes: “Há demasiada política na água”, criticou, para depois esclarecer: “Há boa política e má política no meio disto tudo”. Quanto às dimensões da política que têm vindo a “causar algum dano ao setor”, o orador adiantou, nos últimos anos, vimos “resgates de concessões unilaterais” e mudanças frequentes na legislação. Isso afasta investidores e cria um ambiente de incerteza, reiterou.
Altino Conceição acrescentou que a instabilidade afeta não apenas os privados, mas todo o setor. “É necessário garantir consistência nas políticas públicas” para atrair players competentes e assegurar investimentos sustentáveis. O orador, que participou na 19ª Expo Conferência da Água em representação da ACS, também frisou a importância de abordar a matriz de risco de forma mais equilibrada, permitindo maior transferência de responsabilidades para os privados sem comprometer a rentabilidade dos projetos.
A gestão direta foi igualmente alvo de críticas. Após observar que muitos municípios enfrentam dificuldades devido à falta de recursos e estrutura para gerir eficientemente os serviços de água, Frederico Fernandes analisou que tudo isso cria uma dependência excessiva de subsídios públicos, dificultando a competição justa com os operadores privados.
O futuro das concessões e o papel dos privados
Os intervenientes do painel concordaram que o setor da água exige um volume massivo de investimento nos próximos anos. Pedro Perdigão enfatizou: “os 5,5 mil milhões de euros previstos pelo Plano Estratégico Nacional para o Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais (PENSAARP 2030) vão exigir concessões privadas, capital privado, financiamento privado”. E sem isso não será possível atingir as metas.
Frederico Fernandes frisou a oportunidade de os privados atuarem em novas áreas, como contratos de eficiência hídrica e digitalização de processos. “Há uma enorme oportunidade” para alavancar soluções inovadoras e promover a sustentabilidade, indicou, citando exemplos de sucesso na integração de tecnologias para redução de perdas de água e aumento da eficiência operacional.
Miguel Moura e Silva sugeriu uma revisão do modelo de concessão, propondo que talvez seja o momento de desvincular investimentos massivos de contratos de longa duração e explorar contratos de gestão com maior flexibilidade. Também evidenciou a necessidade de clarificar que áreas continuam a ser monopólios naturais e quais as que podem ser abertas à concorrência.
A inovação como motor de transformação
Frederico Fernandes sublinhou que a inovação será crucial para o futuro do setor: a digitalização e o uso de tecnologias de ponta permitirão reduzir perdas, otimizar processos e aumentar a transparência. O co-CEO da Be Water também ressaltou que os contratos de performance, que vinculam os resultados à eficiência alcançada, podem ser uma alternativa interessante para municípios que desejam explorar novos modelos de gestão.
Outro ponto relevante é a educação e consciencialização dos consumidores. Altino Conceição sugeriu que campanhas públicas podem ajudar a explicar os custos reais da gestão de água, promovendo uma maior aceitação das tarifas justas, pois é importante que o consumidor compreenda que a sustentabilidade do setor depende de tarifas que cubram os custos reais, destacou.
Para finalizar, Altino Conceição reiterou a importância de “aproveitar as competências dos operadores privados” para colmatar lacunas no setor, defendendo que as entidades públicas melhorem a qualidade das suas compras, para atrair maior participação de empresas privadas. Frederico Fernandes terminou com uma mensagem de otimismo. O mercado da água vai abrir novas oportunidades, impulsionado pela digitalização e pelas exigências de sustentabilidade, o que considerou uma janela para a inovação e para soluções criativas. O painel concluiu que, apesar dos desafios, o setor tem potencial para crescer e reinventar-se. Nesse sentido, a colaboração entre públicos e privados e a implementação de políticas consistentes serão cruciais para garantir a eficiência, a inovação e a sustentabilidade no abastecimento de água em Portugal.
—–
Os cinco pecados capitais dos tarifários dos serviços de águas
Jaime Baptista, Conselheiro Estratégico da LIS-Water
Mais de metade das entidades gestoras dos serviços de abastecimento de água e de gestão de águas residuais em Portugal têm resultados líquidos negativos, em claro incumprimento da Lei da Água e do Regime Financeiro das Autarquias Locais e Entidades Intermunicipais. E a isso está associado um conjunto de pecados capitais.
O primeiro pecado capital
A adequada definição das tarifas destes serviços deve passar pelo apuramento rigoroso de todos os gastos por cada entidade gestora, incluindo investimentos iniciais, de substituição, expansão, manutenção, conservação e reparação dos bens e equipamentos, bem como os gastos de operação e gestão eficiente dos recursos utilizados. Mas muitas entidades não o fazem, ou porque não têm contabilidade analítica ou porque não contabilizam amortizações nem preveem a reabilitação das infraestruturas envelhecidas.
O secundo pecado capital
Esses gastos têm de ser cobertos por rendimentos, para se garantir a sustentabilidade e a qualidade do serviço prestado aos consumidores, assim como a expansão e a renovação dos sistemas. Isso é também de elementar justiça do ponto de vista intergeracional, evitando transferir para o futuro a dívida que está a ser criada pela exploração dos serviços. Mas, naturalmente, quando se subestimam os gastos, subestimam-se também os rendimentos necessários, criando um problema.
O terceiro pecado capital
Para a obtenção de rendimentos, pode optar-se pela cobrança de tarifas, pelo recurso a impostos ou ainda a transferências (fundos europeus, por exemplo, que têm, aliás, muito baixo impacto nas tarifas). Por razões de preservação ambiental dos recursos, o princípio do utilizador-pagador aponta para a primeira via, cobrança de tarifas, que contribui para a sensibilização do consumidor sobre uma boa utilização dos recursos. Mas acontece que muitas entidades continuam a praticar tarifas insuficientes, utilizando sem necessidade impostos, prejudicando a realização de outros benefícios à comunidade. E não se argumente que os portugueses não podem pagar estes serviços. Os preços, mesmo quando cobrem os gastos, continuam dentro dos limites da macroacessibilidade económica, são dos mais baixos no espaço europeu, são muito inferiores ao preço de outros serviços essenciais, são centenas de vezes inferiores ao preço da água engarrafada e o seu “valor” para a sociedade é muito superior ao seu “custo” e ao seu “preço”.
O quarto pecado capital
É importante ter presente que a insuficiência de rendimentos em relação aos gastos efetivos dos serviços resulta inevitavelmente em prejuízo dos utilizadores a médio prazo. Acontece em muitas entidades gestoras que os rendimentos não cobrem os gastos, e se não houver subsidiação externa, que onera os cidadãos enquanto contribuintes, ou não prestam o serviço ou baixam a sua qualidade, o que não é aceitável em termos de saúde pública e de proteção ambiental.
O quinto pecado capital
Anualmente, somos confrontados com notícias de imprensa com rankings dos municípios onde as famílias pagam mais e onde pagam menos pelos serviços, santificando as entidades que praticam os preços mais baixos e diabolizando as que praticam os preços mais altos. Sem perceberem ou, percebendo, sem explicarem que isso resulta em boa parte dos quatro anteriores pecados capitais. Que os preços mais baixos resultam de as entidades avaliarem por defeito os gastos dos serviços e, por isso, subestimarem os rendimentos necessários, praticando tarifas insuficientes, ou onerando os cidadãos enquanto contribuintes, ou não prestando o serviço ou baixando a sua qualidade, ou seja, prestando um mau serviço à comunidade, mas mesmo assim sendo santificados.
Sugestão
Pode pois falar-se em gestão deficiente, jornalismo pouco informado e falta de perceção societal do valor do serviço, sendo essencial evoluirmos para uma prática de custos eficientes do serviço.
Agora que a ERSAR retoma os seus poderes de regulação económica, além da enorme expetativa sobre a urgente regulamentação tarifária e sobre a sua efetiva aplicação, fica uma sugestão ao regulador: que, tal como já o faz na qualidade de serviço e na qualidade da água para consumo humano, aprofunde a recolha de informação económica e financeira de todas as entidades gestoras, a sua validação, a sua avaliação analítica procurando identificar padrões, tendências, causas e efeitos, o seu benchmarking e, finalmente, a sua divulgação à sociedade, de forma clara como a água. Para que acabem os pecados capitais dos tarifários e possamos assegura a sustentabilidade económica e financeira do setor e de todas as entidades gestora;, sem nunca esquecer medidas de proteção social das famílias mais carenciadas, através do tarifário social.