Agricultura e Mar
Eduardo Marques, Presidente da Direcção da AEPSA — Associação das Empresas Portuguesas para o Sector do Ambiente
O solo é um recurso natural, mas finito, limitado e não renovável. Mas mesmo assim temos de admitir que a proteção da biodiversidade do solo está ausente da maioria da legislação em matéria de proteção ambiental, e que é ainda inexistente um quadro jurídico completo da União Europeia — adequado, coerente e integrado — para proteger os recursos das terras e dos solos da Europa. Esta é uma lacuna crucial que contribui para a degradação contínua de muitos solos na UE, reduz a eficácia dos incentivos e limita a capacidade da Europa para cumprir o seu Pacto Verde, os seus compromissos internacionais em matéria de ambiente, desenvolvimento sustentável e clima acordados nas recentes COP27 e na COP15, sobre a biodiversidade. Sabemos que 60% a 70% dos solos da UE não são saudáveis e que, todos os anos, na UE, cerca de mil milhões de toneladas de solo são levadas pela erosão, causando uma perda estimada de 1 250 milhões de euros de produção agrícola. Estes são indicadores muito eloquentes que nos mostram que o estado do solo é claramente — e sem equívocos ou desculpas — um grave problema na Europa. Mas tem sido complexa a negociação de um quadro jurídico para a proteção do solo na União Europeia. De facto, desde 2003 que a Comissão Europeia tem vindo a propor aos Estados-membros uma política europeia e o Parlamento Europeu tem vindo, também, a exortar a Comissão Europeia à sua adoção. O Programa Horizonte Europa está profundamente envolvido no que chamou “missão solo” e que significa o financiamento de um ambicioso programa de investigação e inovação, o desenvolvimento de um quadro harmonizado para a monitorização dos solos na Europa e sensibilizar as pessoas para a importância vital dos solos. Em Novembro de 2021, a Comissão adotou a Estratégia de Proteção do Solo da UE para 2030, havendo indicações que a CE pretende vir a aprovar, no próximo mês de junho, uma Lei do Solo com vista à melhoria significativa do estado dos solos até 2050 e protegê-los com a mesma base e força legal que o ar e a água. Estamos, pois, num tempo em que o paradigma do “solo como recurso esquecido” pode vir a ser profundamente alterado. Esta importante iniciativa surge no quadro do Pacto Ecológico Europeu e da Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030 e visa combater as crises do clima e da biodiversidade. A Política Agrícola Comum para o período 2023-2027 torna a agricultura na UE mais justa, mais ecológica e estabelece novas obrigações e incentivos para os agricultores, nomeadamente quanto à preservação de solos ricos em carbono, através da proteção das zonas húmidas e das turfeiras, e a inclusão de regimes ecológicos nos planos dos países da UE para ajudar e incentivar os agricultores a aplicarem práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente. Também as recentes propostas da Comissão Europeia relativas à «revisão do regulamento relativo ao uso do solo, à alteração do uso do solo e às florestas», e que faz parte do pacote «Objetivo 55» no âmbito do «Pacto Ecológico Europeu» de 14 de julho de 2021, a proposta – pioneira – para restaurar os ecossistemas degradados e regenerar a natureza em toda a Europa, das terras agrícolas aos mares, florestas e ambientes urbanos, propondo a redução em 50 % da utilização dos pesticidas químicos e os riscos conexos até 2030, mostra que hoje há uma interconexão estreita entre os domínios da proteção ambiental e da atividade agrícola. Esta visão transversal entre as políticas de ambiente, clima e agricultura está espelhada na Estratégia de Biodiversidade e da Estratégia do Prado ao Prato, na nova estratégia da UE para as florestas, para 2030. Este complexo quadro político da UE tem como objetivo preservar os solos e os ecossistemas, acautelar as consequências mais graves das alterações climáticas e alcançar uma economia sustentável e sem impacto sobre o clima até 2050, bem como preservar zonas rurais prósperas e vivas. Esta iniciativa legislativa sobre a proteção do solo, que se anuncia para o verão, vai dar a este recurso o mesmo nível de proteção do que já está concedido à água, ao meio marinho e ao ar, na União Europeia. É com motivação que a AEPSA aguarda a publicação desta diretiva solo, a qual vai ser absolutamente estratégica para a aprovação – finalmente – em Portugal de um quadro coerente e consolidado de proteção do solo, o Prosolos, sobre o qual temos vindo, todos estes anos, a afirmar a sua necessidade, dado que o solo se assume como ecossistema essencial, complexo, multifuncional, vivo e de crucial importância ambiental e socioeconómica.