Jornal de Negócios
Preços e rendimentos Dos salários às pensões, da eletricidade às telecomunicações, da alimentação às rendas ou dos combustíveis aos transportes. Saiba o que vai mexer com a sua carteira no próximo ano. Inflação volta a penalizar rendimentos Pelo segundo ano consecutivo a variação de preços a níveis historicamente elevados retira poder de compra. Rendimentos vão estagnar em 2023, depois da queda real de 2022.
O que parecia passageiro, limitado a algumas categorias de produtos e controlável, aos poucos se foi enraizando, contaminando toda a economia e com efeitos nocivos para o investimento das empresas e o rendimento das famílias. A inflação alta veio para ficar e por mais tempo do que o inicialmente esperado a níveis que já não eram vistos há três décadas. A inflação, que acaba por ser um imposto “não legislado” – ou escondido –, retira poder de compra aos consumidores, pode contrair o investimento, mas também tem alguns efeitos positivos. Do ponto de vista das empresas, dá-se um ganho quase simétrico da perda gerada do outro lado. Daí se falar em lucros extraordinários e em “windfall tax”. O Estado também acaba por encaixar mais receita por via dos impostos cobrados sobre preços mais elevados. Outro efeito é o aumento da remuneração dos depósitos, que está a demorar a descolar. Ao longo de 2022, a taxa de inflação atingiu níveis historicamente elevados, superando a barreira dos dois dígitos em outubro, nos 10,1%. Em novembro, desacelerou ligeiramente para os 9,9% e espera-se que neste mês de dezembro volte a recuar mais umas décimas – a estimativa rápida do INE é conhecida esta sexta-feira. Mas poderemos ter novos picos no início de 2023 induzidos pelas tradicionais atualizações de preços em janeiro de cada ano. Por exemplo, já se sabe que as portagens vão subir 4,9% mesmo com o travão aprovado pelo Governo e que vai custar 140 milhões de euros ao Estado; ou as rendas que vão aumentar no máximo 2%, também limitadas por decisão do executivo. O facto é que a inflação vai continuar a reivindicar poder de compra às famílias, ou seja, bem-estar, uma vez que os rendimentos não acompanham esta subida abrupta dos preços, tirando os salários mais baixos do Estado. Salários não acompanham Segundo dados do INE, apesar de terem subido, em termos nominais, 4% no terceiro trimestre deste ano, os salários reais, ou seja, com os efeitos da inflação, caíram 4,7%. Já o Banco de Portugal (BDP) diz que os salários nominais no privado devem crescer 5,4% em 2022. A inflação esperada é de 8,1% para o conjunto do ano (medida pelo índice harmonizado de preços no consumidor). “Em 2022, o aumento nominal dos salários por trabalhador no setor privado implica uma redução em termos reais de cerca de 1% refletindo o aumento acentuado e imprevisto dos preços”, indicou no boletim económico de dezembro. E se durante este ano o poder de compra caiu, em 2023 deverá estagnar, prevê o BDP. “Projeta-se uma variação real dos salários no setor privado aproximadamente nula em 2023, que aumenta para cerca de 2%, em média, em 2024-25”, aponta. Mas os impactos da elevada inflação na situação financeira das famílias fazem-se também por outras vias, com o aumento das taxas de juro do BCE. A autoridade monetária já garantiu que vai continuar o ciclo de subidas para travar a escalada de preços, mesmo que tal seja feito à custa de uma quebra da atividade económica, podendo levar a uma recessão na Zona Euro, ainda que ligeira. Taxas de juro mais elevadas representam um encargo mais pesado para as famílias com créditos, sobretudo à habitação, com o impacto a ser mais marcado para as famílias de menores rendimentos e mais endividados, sublinha o BDP. —– Salários sob pressão e mudanças no IRS em duas fases em 2023 Retenções descem, mas só em julho É a principal alteração ao IRS em 2023 ou, pelo menos, aquela que chega a mais contribuintes, mas não significa, na prática, que se vá pagar menos imposto. Falamos das retenções mensais, que a partir do próximo ano vão ter um novo método de cálculo, com maior progressividade e por isso também mais próximo daquele que o Fisco usa quando, no ano seguinte, procede à liquidação do IRS. As novas tabelas de retenção já foram divulgadas e as simulações permitem antecipar mais dinheiro na carteira dos contribuintes todos os meses. Isso, porém, só acontecerá a partir de julho, já que foi preciso dar um período de alguns meses para as entidades pagadoras de salários e pensões se adaptarem. Além disso, menos retenção na fonte significará, também, menos reembolsos no ano seguinte, pelo que convém estar preparado para isso. E só não será tanto porque até julho, continuarão a aplicar-se as tabelas habituais de retenções na fonte, que foram apenas atualizadas para levar em conta outras mexidas, nomeadamente ao nível do mínimo de existência e do salário mínimo, que sobe em 2023 para os 760 euros. Por via destas alterações há alguma descida real de impostos, mas que se nota sobretudo nos rendimentos mais baixos e que é inexpressiva nos mais altos. Ainda em matéria de retenções na fonte, quem se veja aflito para pagar a prestação da casa ao banco, com a subida das taxas de juro, poderá pedir para que a retenção na fonte fique um escalão abaixo do que seria de aplicar desde que esteja em causa a habitação permanente e um rendimento mensal inferior a 2.700 euros. Mas isto também não significa pagar menos – no ano seguinte pode até ser necessário entregar ao Fisco o IRS em falta. —– Só os salários mais baixos alinham com preços Dois meses depois da invasão da Ucrânia, o Governo assumiu que iria deixar cair o compromisso de atualizar os salários da Função Pública pelo menos ao nível da inflação passada. No início de outubro, quando já se tinha percebido que a inflação não era, afinal, “temporária”, o Governo anunciou uma estrutura de aumentos salariais para 2023 bastante mais complexa do que é costume. Assim, em vez de atribuir uma percentagem igual para todos (que dificilmente acompanharia a inflação), o Governo passou para aumentos de valor fixo. Olhando em maior detalhe, os cerca de 123 mil funcionários que recebem o mínimo têm um aumento nominal de 8% para 761,58 euros brutos (um pouco acima do salário mínimo do privado), e são dos poucos que, com sorte, acompanham a inflação deste ano. A partir daí, os aumentos são em regra de cerca de 52 euros brutos o que significa que a percentagem vai diminuindo à medida que o valor do salário aumenta (7%, 6%, 5%, …), estabilizando nos 2% para vencimentos acima dos 2.612 euros. A partir deste patamar o aumento absoluto começa a crescer. Todos os funcionários tiveram também um aumento de 9% no subsídio de refeição, para 5,2 euros por cada dia efetivamente trabalhado, com efeitos retroativos a outubro. Adicionalmente, concretizando o que já tinha sido prometido, a carreira de assistente técnico tem um salto remuneratório adicional (para cerca de 104 euros, mas que nalgumas posições varia) enquanto a de técnico superior avança mais uma posição (a partir da terceira). Foram, de igual modo, ajustadas algumas posições de algumas carreiras gerais que também estavam a ficar demasiado coladas ao mínimo. Para já, nas contas do próprio Governo, os salários sobem em média 3,6% e a massa salarial avança 5,1%, em linha com o definido em concertação social, mas aquém da inflação registada este ano (que se poderá aproximar dos 8%) e esperada para 2023: Comissão Europeia, OCDE e Banco de Portugal apontam para 5,6% a 5,8%, longe dos 4% inscritos no Orçamento do Estado. —– O ano do travão aos aumentos de pensões Os aumentos nominais de pensões podem parecer em janeiro especialmente elevados, mas a quebra real do valor das pensões, tendo em conta a inflação já registada, deverá ser a maior em três décadas. A inflação que serve de base à atualização das pensões ( média sem habitação até novembro) foi de 7,46%, a mais alta desde 1992, ou seja, em trinta anos. Neste cenário, o Governo optou por uma solução tão prudente do ponto de vista orçamental como polémica do ponto de vista político que evita a aplicação dos aumentos que estavam previstos na lei. Se tivesse aplicado a fórmula legal, como garantiu que iria fazer até ao verão, o aumento de preços conjugado com um crescimento passado do PIB superior a 3% implicaria aumentos entre 7,46% (ao nível dos preços) e 8,4% (no caso das pensões mais baixas). A regra foi contudo suspensa em setembro através da aprovação de um “regime transitório de atualização de pensões”. Assim, os aumentos a aplicar em janeiro serão de 4,83% (em vez de 8,4%) para a esmagadora maioria das pensões, inferiores a 961 euros (2 IAS – indexante de apoios sociais). Serão de 4,49% (e não 8,06%) para as que estão entre os 961 euros e os 2.883 euros. E, finalmente, de 3,89% (e não 7,46%) para as que estão entre os 2.883 euros e os 5.765 euros (12 IAS). Estes valores, já ligeiramente ajustados, foram anunciados em comunicado, aguardando-se a publicação de portaria. O Governo tem alegado que os pensionistas não perdem liquidez porque em outubro foi pago um apoio equivalente a meia pensão que na prática soma 3,57 pontos a estes valores. É para cumprir à risca esta lógica que, segundo explicou ao Negócios o Ministério do Trabalho, os aumentos do primeiro escalão não são arredondados. Contudo, este apoio financiado por impostos não será integrado no valor da pensão. A regra de atualização a aplicar de 2024 em diante não está decidida. A quem se quer reformar será útil lembrar que por causa da mortalidade da pandemia a idade de reforma baixa para 66 anos e quatro meses em 2023 e 2024. O corte do fator de sustentabilidade recua para 13,8% no próximo ano. —– Salários podem estagnar depois da quebra A quem não sabia ou já não se lembrava, indicadores recentes mostram o que acontece num cenário de inflação elevada: o salário médio nos setores público e privado subiu 4% no terceiro trimestre deste ano, mas em termos reais a redução foi de 4,7%. A conclusão seria outra se o Instituto Nacional de Estatística (INE) não considerasse uma inflação de 9,1% no terceiro trimestre. A avaliar pelas projeções das principais instituições, os preços deverão dar um novo salto no próximo ano, não tão alto como o atual, nem tão baixo como se esperava há uns meses. Se o Governo desenhou o Orçamento do Estado numa projeção de inflação de 4% – que fica abaixo da referência de 5,1% que sugeriu ao privado – as projeções divulgadas ao longo do mês de novembro apontam para uma inflação, medida pelo IHPC, mais significativa, de entre 5,6% (OCDE) e 5,8% (Comissão Europeia e Banco de Portugal, que acrescenta que os salários deverão estagnar). O salário mínimo, que de acordo com os dados mais recentes abrange 900 mil trabalhadores por conta de outrem, ou um quarto do total, aumenta 7,8% em janeiro ficando praticamente estagnado face à inflação registada. Um inquérito recente da Mercer, sobretudo dirigido a multinacionais, e citado pela agência Lusa, conclui que os aumentos médios previstos por estas empresas em Portugal são de 2,8% no próximo ano. —– Governo promete “descontos” extras no preço da luz em 2023 Depois de um ano de preços recorde no mercado grossista ibérico de eletricidade (Mibel), que obrigou mesmo os governos de Portugal e Espanha a negociarem com Bruxelas um limite máximo para o gás usado para gerar energia elétrica, 2023 arrancará com a promessa de faturas mais baixas para famílias e empresas. A ERSE fala mesmo numa redução de 30% na fatura das indústrias e de 55% dos domésticos. Tanto no mercado regulado como no liberalizado, isto por causa das quedas brutas observadas nas tarifas de acesso às redes, conseguidas com um megapacote de 2.500 milhões de euros que o Governo injetou no sistema elétrico nacional. A ajudar a este cenário, na véspera de Natal, 24 de dezembro, o Mibel registou um preço de 31,43 euros por MWH, um dos mais baixos desde maio de 2021, frisou o Ministério do Ambiente e da Ação Climática (MAAC) em comunicado. Recorde-se que em maio, a eletricidade no Mibel ultrapassou os 570 euros por MWH. “Antevê-se que o nível de desconto no preço da eletricidade seja maior com o aumento da produção hídrica e com as alterações no Mecanismo Ibérico”, disse também o MAAC. O valor de ajuste do mecanismo ibérico será pago pelos consumidores de todas as elétricas, à exceção da Goldenergy e do mercado regulado. Na sua avaliação, o Governo sublinha que “já começam a ser conhecidos os impactos destas medidas nas decisões de alguns comercializadores, antecipando-se benefícios para os consumidores”. A Endesa promete manter o valor global das faturas em 2023, e para isso irá reduzir os preços da eletricidade do segmento residencial. Isto “apesar da volatilidade do custo de aquisição de energia”. A Galp anunciou que vai reduzir os preços da energia elétrica em 11%, enquanto no gás mantém as faturas no primeiro trimestre de 2023. Para uma família com dois filhos, “esta atualização [na luz] irá traduzir-se numa descida média de 3,5 euros a 6 euros” por mês, indica a empresa. Já a Goldenergy optou por oferecer tarifas com preços fixos e manter em 2023 as deste ano, sem acrescentar outros valores variáveis (como o do ajuste do mecanismo ibérico). Também no gás natural, a elétrica não prevê subir preços. A Iberdrola foi mais longe e anunciou uma redução de 15% nas faturas. Contas feitas, para um agregado familiar com duas pessoas e um consumo médio de 1.900 kwh, trata-se de uma descida média de cinco euros por mês. A empresa garante que manterá também todos os descontos associados a contratos já em vigor. Em sentido contrário, a EDP Comercial anunciou que vai aumentar em cerca de 3%, em média, o valor da fatura da eletricidade dos clientes residenciais, refletindo a volatilidade do custo de aquisição de energia. No mercado regulado, a ERSE anunciou para 2023 um aumento das tarifas da luz de 3,3%. Na fatura de janeiro, uma família com dois filhos pagará mais 1,41 euros na fatura. No gás, o aumento no mercado regulado será de 3% (mais 70 cêntimos para a mesma família com dois filhos). —– Meo aumenta preços a partir de fevereiro. Nos e Vodafone ainda sem decisão A Meo foi a única das três operadoras de telecomunicações principais a anunciar que vai aumentar os preços no próximo ano. Da parte da Nos e da Vodafone Portugal, a indicação é de que ainda não é possível antecipar se o novo ano trará mexidas nos preços. “A Meo vai proceder à atualização dos preços a partir de fevereiro, com base no Índice de Preços no Consumidor, sendo que os clientes que têm apenas voz fixa e os clientes com plano de reformados estão excluídos deste aumento”, refere a empresa ao Negócios, reforçando a comunicação já feita em outubro. O Governo estima que a inflação seja de 7,4% este ano, mas o Conselho das Finanças Públicas admite um valor mais alto. Já a Vodafone diz não ser ainda “possível antecipar a expressão ou timings de eventuais alterações de preços”. Realça, contudo, os “enormes desafios internos” que a empresa tem enfrentado de forma a evitar transmitir o aumento dos preços aos consumidores, salientando que “esse é um esforço não compatível com a expressão da taxa de inflação ou com o seu caráter de médio-longo prazo”. A dias de fechar o ano, também a Nos diz não conseguir antecipar qualquer decisão. Já a Nowo garantiu que “não tem prevista uma atualização de preçários dos serviços para os seus atuais clientes no início do ano”. A operadora aguarda luz verde da Autoridade da Concorrência para ser comprada pela Vodafone, pelo que “a premissa de garantir que não há um aumento é para o início do ano, sob esta administração”, detalha fonte oficial da operadora. —– CGD é o único que promete não agravar custos Os cinco maiores bancos a operar em Portugal – Caixa Geral de Depósitos (CGD), BCP, Novo Banco, BPI e Santander – cobraram 1,57 mil milhões de euros em comissões nos primeiros nove meses de 2022. Todos encaixaram mais dinheiro do que em igual período de 2021 – uma subida que acontece há dois anos consecutivos. Mas as perspetivas de aumento das comissões para 2023 não são tão claras. Apenas Paulo Macedo, CEO da CGD, já disse expressamente que o banco não vai aumentar as comissões, deixando, ainda assim, um alerta: “Se ficarmos completamente fora do mercado, teremos de repensar.” O presidente executivo do BCP, Miguel Maya, não é tão taxativo, tendo já dito que não vê “racional para as comissões descerem”, acrescentando que a expectativa “é que continuem a refletir o preço justo e competitivo”, na Money Conference 2022. O administrador do Novo Banco Luís Ribeiro concordou, ao garantir, no mesmo evento organizado pela Global Media em novembro, que os preçários dos bancos não vão acompanhar a inflação. Apesar disso, o Novo Banco atualizou o preçário tornando mais caro, a partir de março e abril, uma série de custos, incluindo manutenção de conta ou serviços mínimos. Nem João Pedro Oliveira e Costa, CEO do BPI, nem Pedro Castro e Almeida, CEO do Santander, se pronunciaram sobre mudanças nas comissões. —– Preços devem aumentar no início de 2023, mas podem estabilizar ao longo do ano O preço da alimentação vai continuar a subir em 2023, com as empresas a repercutirem parte do aumento dos custos de produção no preço final de venda. O encarecimento deverá ser transversal, incluindo a carne, o peixe, as conservas, o pão e o leite, entre outros. A diretora executiva da Associação Portuguesa dos Industriais de Carne, Graça Mariano, diz ao Negócios que “os fatores de produção, incluindo a matéria-prima e os preços da energia, tiveram um aumento estrondoso, mas as empresas não conseguiram refletir isto no valor de venda”. A previsão é que o preço aumente – numa percentagem que a associação não avança – mas, ainda assim, o setor “não conseguirá cobrir a subida dos custos de produção”. Também o presidente da Associação Nacional de Comerciantes e Industriais de Produtos Alimentares (ANCIPA) admite alterações adicionais aos preços, pelo menos nos primeiros meses de 2023. Manuel Tarré nota que o encarecimento da produção não foi refletido no preço final. “Alguns produtores estão a vender abaixo do custo”, explica, pelo que “vai haver um ajuste no início do ano e depois o preço deverá estabilizar”. Uma coisa é certa: esses aumentos, diz Tarré – que também é CEO da Gelpeixe – não podem continuar ao mesmo ritmo: “A subida vertiginosa de 2022 não se pode repetir em 2023, mais ainda seria impossível.” A convicção vale para a carne, para o peixe e para todo o tipo de produtos alimentares. Os preços das conservas vão também aumentar no início do ano, com subidas diferenciadas em função do tipo de produto. Os que incluem azeite vão encarecer pelo menos 10%, prevê o presidente da Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe. As más colheitas em Espanha e na Tunísia levaram a que o preço do azeite tenha ultrapassado a marca dos cinco euros e “isso terá impacto”, diz José Freitas. O preço dos produtos à base de óleo também vai subir, mas de forma residual. A Associação das Empresas de Distribuição (APED) – que representa as grandes superfícies, responsáveis por grande parte dos produtos alimentares consumidos no país – avisa que “as pessoas devem ter consciência de que enquanto tivermos pressão em toda a cadeia de valor em fatores como a energia, é cedo para dizermos que os preços estão estabilizados. O diretor-geral da APED, Gonçalo Lobo Xavier, avança também que embora exista hoje “uma redução no preço de ‘commodities’ como os cereais e a energia, é uma redução que só é vertida para os preços finais no prazo de um a dois meses”, porque os preços praticados em cada momento refletem compras contratadas nos meses anteriores. Lobo Xavier assegura que as empresas de retalho alimentar, “dada a elevada concorrência, continuam com esmagamento ou mesmo redução de margens em produtos essenciais”. O responsável garante também que a recém-criada taxa sobre os lucros extraordinários do setor “não vai ter impacto no preço dos produtos”. O leite e o pão também poderão aumentar em 2023: as associações destes setores avisaram recentemente para essa possibilidade. —– Incerteza e contenção são palavras de ordem no setor Depois do forte impacto provocado pela pandemia, o turismo regressou em força e 2022 foi o ano de vários recordes do setor. O Governo aponta para uma previsão das receitas na ordem dos 20 mil milhões de euros, ficando 4% a 5% acima das verbas arrecadadas em 2019, quando se atingiram cerca de 18 mil milhões. Ainda assim, para 2023 as palavras de ordem são a incerteza e a contenção, com vários grupos hoteleiros a abrandarem nos investimentos. A guerra em curso na Europa, a que se soma a subida da inflação e das taxas de juro, levou este ano a hotelaria e a restauração a rever em alta, entre 15% e 20%, a tabela de preços cobrados. Aumentos que deverão continuar em 2023. Com todo este cenário, as famílias veem o poder de compra a encolher e viajar em 2023, para muitos, deixará de estar na lista de prioridades. Além disso, “as empresas vão precisar de tempo para recuperar da situação frágil depois da pandemia. Por outro lado, se as receitas têm crescido, os custos também, nomeadamente com os recursos humanos”, o que faz com que “apesar de repercutirem esses custos nos preços, as margens são muito curtas e isso é preocupante porque o turismo é o motor da economia”, alertou a ex-secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, à Renascença. No entanto, o ministro da Economia, António Costa Silva, faz uma previsão mais otimista tendo “esperança” de que 2023 “seja ainda de resiliência da economia portuguesa, em particular do turismo, com abrandamento, mas continuaremos a crescer”. —– Euribor não vai dar descanso antes do verão. Pode atingir os 3,7% a seis meses Quem tem crédito à habitação com taxa variável tem sentido, ao longo dos últimos meses, as consequências da subida das taxas de juro na Zona Euro. E o próximo ano (pelo menos a primeira metade) não deverá trazer melhores notícias. Os mercados estimam que as taxas Euribor – que servem de indexante a estes empréstimos – continuem a subir e, a seis meses, possa mesmo atingir os 3,7% em meados de 2023. A quase totalidade dos créditos para compra de casa em Portugal tem uma taxa de juro variável, que tem tendencialmente um custo mais baixo, mas deixa as famílias mais vulnerárias à volatilidade dos juros. Foi o que aconteceu este ano, quando o Banco Central Europeu (BCE) decidiu subir as taxas de referência na Zona Euro (pela primeira vez em 11 anos) para travar a inflação. Face à decisão da presidente do BCE Christine Lagarde (de subir juros em julho, setembro, novembro e dezembro), as Euribor dispararam. A taxa a seis meses, a mais utilizada em Portugal nos créditos à habitação, tinha estado negativa entre novembro de 2015 e junho de 2022, negociando atualmente acima de 2,7%. É o valor mais elevado desde janeiro de 2009. A tendência de agravamento deverá manter-se. Os contratos de futuros sobre a Euribor apontam para que o próximo ano traga novas subidas até o pico ser atingido, no final de junho, em 3,72%. Depois disso, é esperado que recue até 3,5% no final do ano. No prazo a 12 meses, a Euribor está próxima de 3,3%, também num máximo desde janeiro de 2009. Após ter regressado a terreno positivo em abril, seis anos depois de ter estado negativa, tem vindo a agravar desde então. Já a três meses, a Euribor está acima de 2,14%, sendo que esta taxa esteve negativa entre abril de 2015 e julho. Em todas as maturidades, a perspetiva futura é que continue a agravar ao longo de 2023. As Euribor são fixadas pela média das taxas às quais um conjunto de 57 bancos da Zona Euro está disposto a emprestar dinheiro entre si no mercado interbancário pelo que reagem de forma imediata aos juros do BCE. No último encontro do banco central, a 15 de dezembro, Christine Lagarde garantiu que os juros ainda irão aumentar “significativamente” para travar a escalada dos preços. Os orçamentos das famílias vão, assim, continuar a ser penalizados pela evolução da Euribor, uma tendência que se tem vindo a fazer sentir ao longo de 2022. De acordo com os últimos dados do INE, a taxa de juro implícita dos contratos de crédito à habitação sobe há oito meses consecutivos. Em novembro, esta fixou-se em 1,597%, uma subida de 26,9 pontos face ao mês anterior e atingindo assim o valor mais elevado desde dezembro de 2012. —– Aumentos ficam limitados a 2% Miguel Baltazar Quem tenha um contrato de arrendamento ao qual se aplique a regra geral de atualização anual em função da inflação tem garantido à partida que em janeiro o aumento da renda só será de 2%. O travão foi fixado pelo Governo quando se percebeu que, com os preços a subirem, a aplicação da regra implicaria em 2023 aumentos na ordem dos 5,4%. Esta proteção às famílias veio acompanhada por uma compensação aos proprietários, mas pela via fiscal, o que significa que pagarão menos IRS em 2024, mas só aí serão ressarcidos. O travão não se aplicará, contudo, a quem tenha contratos que já prevejam expressamente outro tipo de atualizações. E também não terá qualquer efeito nos novos contratos, sendo que o mercado continua ao rubro e as rendas mantêm a tendência de subida que registam há muito tempo. Ainda que 2023 possa trazer alguns ajustamentos, os especialistas não antecipam grandes reduções nos preços, desde logo porque não se espera que a oferta cresça. É que a falta de imóveis no mercado do arrendamento é um dos grandes fatores que têm vindo a impulsionar os preços das rendas e as medidas do Governo, nomeadamente com o aumento da oferta de imóveis públicos, não terão efeitos no imediato. Estão previstos, no entanto, mais apoios, nomeadamente um alargamento do programa Porta 65 e um ajustamento das regras do programa de arrendamento acessível, para ser possível abranger mais pessoas. —– Petróleo abaixo dos 80 dólares por barril pode dar alívio nas bombas aos condutores A guerra na Ucrânia fez disparar os preços do petróleo para muito próximo de máximos de sempre em 2022, penalizando os condutores no momento de irem às bombas abastecer o carro. No próximo ano é expectável um alívio nos preços, que poderá refletir-se também nos combustíveis. Com as perturbações à produção e as sanções à Rússia, por um lado, e a política “zero covid” na China, por outro, a pesarem no desempenho da matéria-prima, o Brent do Mar do Norte, referência para as importações europeias, chegou a atingir os 139 dólares por barril, em julho. Por essa altura, a gasolina simples custava, nas bombas, 2,17 euros por litro e o gasóleo 2,07 euros. Desde então houve um alívio nos mercados internacionais, com o Brent a negociar próximo dos 84 dólares por barril no fecho do ano. Para 2023, os contratos de futuros apontam para uma tendência de descida, pondo o preço da matéria-prima nos 79,5 dólares. Há, contudo, analistas mais pessimistas. Além do petróleo, também a fiscalidade pesa no orçamento dos condutores. Neste domínio, o Governo tem implementado um desconto do ISP para mitigar o impacto do agravamento dos preços dos combustíveis. O valor é atualizado mensalmente. —– Preços sem grandes mexidas e hipótese de incentivo ao abate Tal como em 2022, os preços dos automóveis não serão muito agravados por via fiscal. As simulações da PWC apontam para um aumento no preço final que pode chegar a 1,6%. Contudo, os fabricantes deverão proceder às habituais atualizações nos preçários e poderão refletir os custos mais elevados na produção. Várias fontes do mercado indicaram ao Negócios que as marcas terão dificuldade em “comprar” quota de mercado por via do preço, uma vez que as margens dos fabricantes estão bastante mais curtas. Para as empresas passa a existir uma taxa de tributação autónoma de 10% para os veículos 100% elétricos com valor superior a 62.500 euros. Existe ainda a esperança de que o prometido incentivo ao abate de veículos em fim de vida possa ainda vir a vigorar em 2023, mas nunca antes do segundo semestre. —– Passes mantêm preço, mas títulos ocasionais vão subir em média 6,11% em janeiro O Governo decidiu ainda em setembro congelar todos os aumentos de preços dos passes de transportes públicos e dos bilhetes da CP durante o ano de 2023, mas os títulos e tarifas de transporte ocasionais terão um aumento de 6,11%. Esse foi o limite determinado pela Autoridade da Mobilidade e dos Transportes para a taxa de atualização tarifária (TAT) no próximo ano, a qual tem como valor máximo a taxa de variação média do Índice de Preços no Consumidor, exceto habitação, nos 12 meses que decorreram entre outubro de 2021 e setembro de 2022. Assim, por exemplo, os bilhetes ocasionais do Metropolitano de Lisboa e da Carris, que hoje custam 1,50 euros, vão aumentar 15 cêntimos para 1,65 euros por viagem. Também a Fertagus, operadora do comboio sobre a ponte 25 de Abril, anunciou já que vai aplicar um aumento médio das tarifas de 6,11%. No caso de uma viagem entre Lisboa e Setúbal o aumento será de 25 cêntimos para um total de 4,85 euros. No Porto, viajar de metro ou de autocarro também ficará mais caro. No tarifário intermodal Andante, um bilhete Z2 (o mais barato) passa a 1 de janeiro a custar mais cinco cêntimos para 1,30 euros. —– Travão do Governo leva a subida das taxas em 4,9% As taxas de portagem nas autoestradas vão aumentar 4,9% a 1 de janeiro, depois de o Governo ter considerado “insuportável” a subida proposta pelas concessionárias – com base no Índice de Preços do Consumidor de setembro ou outubro, conforme os contratos – que ditaria atualizações entre 9,5% e 10,5%. Acima do aumento de 4,9% para os utilizadores, 2,8% serão suportados pelo Estado e o restante pelas concessionárias. A dimensão da subida a 1 de janeiro irá ainda ser apurada em cada troço, já que o método de atualização das portagens inclui um mecanismo de arredondamento para o múltiplo de cinco cêntimos mais próximo. Ou seja, se os aumentos forem inferiores a 2,5 cêntimos a portagem manter-se-á inalterada, enquanto se for superior a 2,5 cêntimos há um arredondamento para cinco cêntimos.