Jornal de Notícias
COP chega ao fim com nota de “esperança” e alguma “frustração”
Países saúdam criação de fundo que compensa nações afetadas pela crise climática, mas lamentam falta de avanços nas outras áreas. António Guterres critica falta de resposta a emissões poluentes
A Cimeira do Clima (COP27) terminou quase um dia e meio depois do planeado, mas nem o prolongamento dos trabalhos conduziu a soluções do agrado de todos. Se, por um lado, houve acordo para a criação de um fundo de compensação pelos danos causados pela crise climática – que os ambientalistas portugueses consideraram “histórico” –, por outro, a falta de avanços para conter as emissões de gases com efeito de estufa deu lugar, nas palavras da ministra alemã dos Negócios Estrangeiros, a alguma “frustração”. Também o secretário-geral da ONU, António Guterres, lamentou que pouco tenha sido feito nesse capítulo. Da cimeira do Egito, que juntou quase 200 países, saíram dois textos principais: uma resolução que cria o fundo de compensação e uma declaração final. Esta última foi amplamente criticada por não trazer avanços suficientes em áreas-chave, como o controlo da temperatura, a limitação gradual dos combustíveis fósseis ou, sobretudo, os cortes nas emissões de gases poluentes [ler P&R]. “Perder tempo precioso” Os reparos do secretário-geral da ONU visaram, precisamente, a falta de avanços a nível dos gases com efeito de estufa. “Precisamos de reduzir, drasticamente, as emissões agora e essa é uma questão a que esta COP não respondeu”, lamentou António Guterres. O vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, considerou que a cimeira não foi mais do que “um passo muito curto” para o planeta. Segundo Timmermans, a declaração final da COP27 não impõe “esforços adicionais suficientes” aos maiores poluidores, no sentido de “acelerarem as suas reduções de emissões”. Para a ministra alemã dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock, os resultados da COP27 combinam “esperança e frustração”: se a criação do fundo representou “um avanço em matéria de justiça climática”, o impasse na questão das emissões deixou-a apreensiva. “O Mundo está a perder tempo precioso”, alertou. De França chegou uma leitura semelhante, com a ministra da Transição Energética a saudar o “avanço” da criação do fundo, mas a considerar tudo o resto “uma verdadeira desilusão. Não se avançou na necessidade de fazer mais esforços para reduzir os gases de efeito de estufa nem em eliminar progressivamente os combustíveis fósseis”, frisou Agnès Pannier-Runacher. A Suíça, por seu turno, lamentou que a COP27 não tenha imposto obrigações aos principais poluidores. Já a criação do fundo de compensações foi muito elogiada – ainda que se destine, sobretudo, aos países “mais vulneráveis”. O primeiro-ministro do Paquistão – nação fustigada por fortes cheias causadas pelas alterações climáticas – considerou-o “um primeiro passo decisivo” rumo a uma maior “justiça”. A África do Sul subscreveu e pediu “mais ações urgentes”. Para a Greenpeace, o fundo é uma “pedra basilar” que “há muito tardava”. Numa nota conjunta, as portuguesas Zero e Oikos concordaram que esse passo foi “histórico”, embora tenham lamentado a falta de avanços nas áreas das perdas e danos, mitigação, adaptação e financiamento. “Em nenhuma delas, esta COP27 cumpriu inteiramente”, referiram. — P&R Augusto Correia Quais foram as principais conclusões da cimeira? A COP27 adotou dois textos principais: a declaração final e a resolução sobre a compensação pelos danos causados pelas alterações climáticas em países vulneráveis. O que diz a declaração final? A declaração final da COP27 realça a necessidade urgente de reduções imediatas, profundas, rápidas e sustentadas das emissões de gases com efeito de estufa. Na parte relativa ao aquecimento, reafirma o objetivo do Acordo de Paris, que visa conter o aumento da temperatura média abaixo de 2 °C relativamente aos níveis pré-industriais – idealmente, não superando os 1,5 °C. No que toca à energia, apela à “aceleração dos esforços” para eliminar, gradualmente, o uso de “carbono (CO2) sem captura” e para a remoção dos subsídios ineficazes aos combustíveis fósseis. Pede, ainda, a “aceleração de transições limpas e justas para a energia renovável”. Muitos países queriam ver mencionada a redução do uso de petróleo e do gás e não apenas dos subsídios. E a resolução sobre compensações por danos? Foi o grande marco da cimeira. Cria um fundo de intervenção em caso de perdas e danos nos “países mais vulneráveis” às alterações climáticas, inovação que a Greenpeace descreveu como sendo uma “pedra basilar” para apoiar nações que “já estão a ser devastadas” por esse fenómeno. Será criado, também, um “comité de transição” responsável pelas regras de funcionamento e de financiamento do fundo – nomeadamente, quem serão os contribuintes. O comité terá de fazer recomendações “para consideração e adoção” na COP de 2023. As conclusões da COP foram do agrado de todos? Não. O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que a cimeira “não respondeu” à necessidade de se “reduzir drasticamente” as emissões de gases com efeito de estufa. Vários países e entidades, como a União Europeia, a Alemanha ou a França, também lamentaram o alcance limitado das decisões finais. E qual a opinião dos ambientalistas? As organizações Zero e Oikos consideraram que o fundo para compensar danos climáticos é um avanço “histórico”, mas frisaram que a redução das emissões “fica muito aquém do necessário. O texto final não reflete a necessidade de eliminar gradualmente todos os combustíveis fósseis”, lamentaram, numa nota conjunta.