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O país preparou menos resíduos para reutilização e reciclagem e enviou mais para aterro, afastando-se das metas que tinha em matéria de gestão de resíduos urbanos. Menos emissões e energia consumida, e melhor qualidade do ar são as boas notícias, com uma ajuda da pandemia. Os dados de 2020 sobre o Estado do Ambiente, divulgados esta quarta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram um país fortemente influenciado pela pandemia, com menos emissões de gases com efeito de estufa (GEE), menor consumo de energia e melhor qualidade do ar. Mas, como o próprio documento refere, “nem todos os indicadores ambientais tiveram evolução positiva”, e a gestão de resíduos aparece como o principal aspecto negativo do ano. Houve uma diminuição da preparação dos resíduos para reutilização e reciclagem e um aumento da deposição de lixo em aterro, o que fez com que o país se tenha afastado das metas a que se tinha proposto para aquele ano. Apesar da forte contracção da actividade económica e do confinamento a que os portugueses estiveram sujeitos durante parte do ano, 2020 assistiu à “quase manutenção dos resíduos urbanos gerados”, o que agravou o rácio entre eles e o produto interno bruto (PIB) em 8,5%, comparando com dados de cinco anos antes. Mas este é daqueles dados que pode não significar muito – o volume de resíduos, ainda assim, reduziu-se nuns curtíssimos 0,06% -, só que quando olhamos para a forma como estes resíduos foram geridos é que o cenário fica pior. O INE diz que, no ano passado, apenas preparámos para a reutilização e reciclagem 38% dos resíduos urbanos (a meta era 50%) e, por outro lado, a deposição em aterro cresceu para 53% (não queríamos ir além dos 35%), afastando o país das metas a que se propusera e piorando os indicadores de 2019 – uma quebra de três pontos percentuais, no primeiro caso, e um aumento de oito, no segundo. Influência da pandemia, sustenta o INE, destacando que esta teve “um impacto heterogéneo” nos diversos ramos da actividade económica ao nível dos resíduos. Ou seja, como era previsto, houve uma diminuição dos resíduos gerados pelo tecido empresarial (11,3 milhões de toneladas, menos 0,9% do que no ano anterior), tendo-se verificado um crescimento apenas na actividade agrícola e na construção. Empresas menos ecológicas O outro dado negativo revelado pelo INE nesta análise ao estado do ambiente do país é a “diminuição do grau de adesão das empresas à adopção de actividades de gestão e protecção do ambiente”. A queda foi de 1,8 pontos percentuais, comparando com 2019, num valor que já não é famoso: apenas 16,3% das empresas industriais desenvolveram este tipo de actividades. As boas notícias são que as más notícias param por aqui. Tal como já se antevia da avaliação parcial feita pelo INE há um ano (e que olhava para dados entre Janeiro e Setembro, ficando por avaliar o último trimestre), e também pelo mais recente relatório da Agência Portuguesa do Ambiente , os restantes indicadores avaliados demonstram uma clara influência positiva da pandemia no ambiente nacional. Perante um ano em que se produziu menos – o Índice de Produção Industrial diminuiu 7% -, e em que se consumiu também muito menos (queda de 7,3% no consumo privado e diminuição das despesas familiares de 10,4% com bens correntes não alimentares e serviços e de 7,7% com bens duradouros), vivemos com menos emissões de GEE e com melhor qualidade do ar. O INE coloca a queda de emissões de GEE em 8,5%, comparando com 2019, com destaque para o decréscimo de emissões na produção de electricidade (18,8%) e no transporte (15,9%). E se, no primeiro caso, a queda se deveu “a um maior recurso às fontes renováveis [responsável por 59,6% do total da energia produzida] e diminuição do consumo de carvão”, no caso dos transportes ela tem uma causa evidente: “Foi consequência das medidas de confinamento da população devido à pandemia”, refere-se no documento. O travão na vida das pessoas também se fez sentir de forma muito marcante na venda de veículos novos e no consumo do combustível no transporte rodoviário, que o INE considera terem sido “severamente afectados pela pandemia”. A quebra foi, respectivamente de 35% e 15,2%. Este factor terá também tido influência no Índice de Qualidade do Ar, com o país a apresentar 33,8% dos dias do ano com qualidade de ar “muito bom”. Mais de um terço e também mais do que acontecera em 2019, em que essa percentagem se saldara nos 31,1%. Os restantes indicadores analisados para avaliar este Estado do Ambiente 2020 já não estão tão inter-relacionados com a situação pandémica que se viveu ao longo do ano. Nomeadamente, no que diz respeito à qualidade da água nas zonas balneares , que se manteve muito elevada – 94,3% das águas balneares costeiras e de transição e 75,5% das águas balneares interiores foram classificadas com qualidade “excelente” -, contribuindo que já este ano tenhamos tido o maior número até agora de praias com Bandeira Azul, 372, mais 12 do que no ano passado. Ao nível dos incêndios, 2020 foi um ano com menos fogos rurais do que 2019 (9678 no total), mas com mais área ardida , comparando os dois anos. Em 2020, essa área foi de 68,6 mil hectares, quando tinha sido de 42,2 mil hectares em 2019. Olhando para a parte da economia e finanças ligadas ao ambiente, o INE destaca um aumento da despesa da administração pública para protecção ambiental (1585 milhões de euros em 2020, contra 1388 milhões em 2019), bem como das transferências realizadas pelo Fundo Ambiental, que aumentaram cerca de 48%, ascendendo aos 562 milhões de euros. Pelo lado negativo, e de novo com a pandemia como pano de fundo, o INE aponta uma diminuição de 8% do número de inscritos nas organizações não-governamentais do ambiente (ONGA) e uma quebra de 18,9% nas actividades por estas realizadas ao longo de 2020. Os passeios na natureza (menos 41,2%), congressos, seminários e acções de formação (menos 37,7%) e as acções junto dos media (menos 30,2%) foram muito menos do que os habituais, “decorrente da pandemia”, salienta o INE.