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O Orçamento do Estado para 2021 aprovou alterações dos poderes regulatórios da ERSAR, designadamente no que concerne à fixação de tarifas, nos termos da proposta de lei do Partido Comunista Português, que vem introduzir mudanças na lei que aprovou os estatutos da ERSAR e no Decreto-Lei que estabeleceu o regime jurídico da concessão da exploração e da gestão em regime de serviço público dos sistemas multimunicipais de tratamento e de recolha seletiva de resíduos urbanos, atribuída a entidades de capitais exclusiva, ou maioritariamente privados, já que se passa a incluir estas concessões no âmbito da fixação de tarifas por parte da ERSAR o que, até ao momento, não sucedia, e configurava um entrave à universalização do novo regulamento tarifário ainda em discussão.
É de questionar como é que uma proposta inclusa na Lei do Orçamento de Estado se arroga de alterar os Estatutos da ERSAR e o regime jurídico das concessões a privados, mas isso sou eu, que, pelos vistos, tenho mau feitio.
Por outro lado, retira o poder da ERSAR em fixar as tarifas dos sistemas estatais, ou geridos por entidades de capital exclusivamente público (sistemas em Alta e Baixa, EPAL – mas que já era assim – será que a intenção é harmonizar pela bitola da EPAL?), ficando essa situação de ser definida no respetivo contrato de concessão/delegação, pelo concedente, Estado.
Fica, ainda, a ERSAR, impossibilitada de aprovar regulamentos, podendo passar, só, a aprovar recomendações (o que não deixa de ter a sua lógica, dado que a ERSAR é o regulador e, não, o legislador).
Por fim, outra alteração a sublinhar, situa-se ao nível da atribuição ao Estado ou município – concedente – da competência para aprovar os planos de investimentos dos sistemas multimunicipais de tratamento e de recolha seletiva de resíduos urbanos, atribuída a entidades de capitais exclusiva ou maioritariamente privados, estando a decisão do concedente condicionada à precedência de parecer da Autoridade Ambiental Nacional e da Autoridade Reguladora do setor. Esta alteração significa, portanto, que os planos de investimento da EGF passam a ser aprovados pelo Estado.
O alcance destas alterações melhor poderá ser esclarecido por alguém da ERSAR (que possui 90 dias para as acomodar aos seus Regulamentos, que agora já nem pode aprovar e cujo impacto também se poderá vir a verificar ao nível das suas Recomendações… alguém que me explique isto como seu fosse um miúdo de quatro anos!). Estou-me a lembrar, por exemplo, da eventual interferência no processo de audição, discussão e aprovação do novo regulamento tarifário (não sei se ainda se lembram…), o que não deixará de ser um estimulante desafio para os novéis vogais do respetivo Conselho de Administração, Joaquim Barreiros e Vera Eiró. Não sabiam? Eu também não, até há poucos dias atrás…
Só para memória futura, fiquemos, então, todos, a saber, que os membros do conselho de administração da ERSAR, indigitados, são nomeados por resolução do Conselho de Ministros, sob proposta do membro do Governo responsável pela área do ambiente. As nomeações são precedidas de audição da comissão competente da Assembleia da República, a pedido do Governo, acompanhada da fundamentação das respetivas escolhas e do parecer da Comissão de Recrutamento e Seleção da Administração Pública relativo à adequação do perfil às funções a desempenhar, incluindo o cumprimento das regras de incompatibilidade e impedimentos aplicáveis.
Assim, o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, indigitou as personalidades atrás referidas, no início de outubro do ano passado e o Conselho de Ministros nomeou-os, através da Resolução de Conselho de Ministros n.º 96-A/2020, de 12 de novembro, após parecer positivo da CReSAP, e da audição na Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, no dia 14 de outubro de 2020, que se pronunciou favoravelmente sobre as respetivas nomeações, constantes da resolução, através de parecer datado de 23 de outubro de 2020.
Há aqui qualquer coisa que não bate certo, mas não quero voltar a ser acusado de ter mau feitio.
Resta-me desejar as maiores felicidades aos novos vogais do Conselho de Administração da ERSAR, convicto que estarão à altura dos enormes desafios que este setor encerra e eivados de uma ambição e de uma motivação hercúlea para corresponderem às expetativas (que, a esta altura, só posso definir quantitativamente).
Bom ano!
Nuno Campilho é licenciado em Relações Internacionais e Pós-graduado em Comunicação e Marketing Político, em Ciência Política, e em Tecnologias e Gestão da Água. Executive MBA do IESE/AESE. Doutorando em Políticas Públicas no ISCTE-IUL. Foi presidente da União das Freguesias de Oeiras, Paço de Arcos e Caxias, administrador dos SMAS de Oeiras e Amadora e chefe de gabinete do Ministro do Ambiente, Isaltino Morais. Exerceu, ainda, funções de vogal do Conselho de Gerência da Habitágua, E.M. Foi titular do cargo de Diretor Delegado dos SIMAS de Oeiras e Amadora, até ao final de janeiro de 2020, é membro da Comissão Especializada de Inovação da APDA e Senior Business Partner da Mundi Consulting.