Água&Ambiente na Hora
Os adsorventes produzidos a partir de biomassa vegetal pirolisada (resíduos de podas de diferentes árvores de fruto e vinhas) podem ajudar no processo de remoção de micropoluentes das águas residuais tratadas de forma a permitir a sua reutilização para diferentes usos com segurança.
Este tratamento físico-químico por adsorção é apenas uma das possibilidades que está a ser estudada no âmbito do projeto REWATER, financiado pela União Europeia e desenvolvido por um consórcio de nove entidades europeias de Portugal, Roménia, Espanha e Suécia.
Em Portugal o projeto envolve 15 investigadores do REQUIMTE/LAQV – Laboratório Associado para a Química Verde, Instituto Superior de Engenharia do Instituto Politécnico do Porto, CIIMAR – Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto e Águas do Centro Litoral.
Um dos objetivos deste projeto, que conta com uma equipa multidisciplinar, é encontrar “soluções mais económicas de tratamento, que viabilizem a reutilização de águas residuais tratadas, em condições seguras, valorizando este recurso de acordo com os princípios da economia circular”, revela a equipa de investigadores ao Água&Ambiente na Hora.
O consórcio pretende também desenvolver “métodos analíticos, com recurso a sensores eletroquímicos, rápidos e de baixo custo, para monitorização in situ dos micropoluentes emergentes em águas”.
Os micropoluentes não são completamente removidos nas ETAR (Estações de Tratamento de Águas Residuais) convencionais e por isso é necessário complementá-las com uma etapa adicional de tratamentos avançados.
“As várias tecnologias que têm sido desenvolvidas apresentam como limitação comum os elevados custos associados, dificultando que os mesmos sejam implementados, motivo por que a comunidade científica tem vindo a procurar alternativas que sejam mais económicas e sustentáveis”, explicam os investigadores.
Outras alternativas tecnológicas para remover os micropoluentes, que estão a ser estudadas no âmbito deste projeto, passam pela regeneração do material saturado por processos eletroquímicos (eletro-Fenton). Os investigadores estão também a estudar tratamentos biológicos por adsorção usando microalgas (Chlorella vulgaris) vivas e liofilizadas e estão a testar ainda a “degradação biológica por enzimas provenientes de fungos (Pleurotus ostreatus)”.
Além disso têm desenvolvido métodos biológicos de avaliação da eficiência destas tecnologias na redução do impacto ambiental produzido pelos micropoluentes. Os tratamentos mais eficientes serão selecionados para o desenvolvimento de estudos à escala piloto, que deverão indicar a potencialidade da aplicação destes tratamentos de afinação.
Este projeto contempla ainda o desenvolvimento de sensores para análise de micropoluentes. Tratam-se de pequenos dispositivos de baixo custo, que podem ser levados para o local onde a análise deve ser realizada, fornecendo informações espaciais sobre a sua presença em tempo real.
Os micropoluentes emergentes, como pesticidas ou fármacos, que se encontram nos efluentes tratados, não são detetados mesmo quando as ETAR cumprem os parâmetros das descargas. Isto porque os teores desses compostos não estão regulamentados, para efeitos dos limites impostos nas licenças de descarga. No âmbito do REWATER foram realizadas várias campanhas de amostragem que confirmam a presença de fármacos e de pesticidas em diferentes matrizes, não só em águas residuais, mas também em águas de rio.
Atualmente existe uma preocupação da União Europeia em monitorizar estes micropoluentes de forma a estabelecer uma Lista de Vigilância, mas “os métodos analíticos disponíveis são morosos, caros e exigem pessoal técnico altamente treinado”, observa a equipa de investigadores.
O CASO DE ESTUDO DA ÁGUAS DO CENTRO LITORAL
A Águas do Centro Litoral, a entidade gestora responsável pelos sistemas de abastecimento de água e de tratamento de águas residuais da zona centro litoral do país, corporiza a valência empresarial deste projeto.
O projeto surge, aliás, na sequência de trabalhos anteriormente realizados, nomeadamente o estudo sobre a incidência de fármacos no Rio Lis, que teve por base a análise das duas ETAR que descarregam águas residuais tratadas no seu curso – a ETAR de Olhalvas, no centro de Leiria, e a ETAR do Coimbrão, no troço final do rio.
“Nos trabalhos desenvolvidos avaliou-se a presença de micropoluentes no rio Lis – alguns detetáveis em escala significativa logo na nascente – e estudaram-se os mecanismos da sua disseminação no meio hídrico, ao longo do percurso, bem como a contribuição das ETAR de Olhalvas e do Coimbrão”.
A entidade gestora já reutiliza, nestas ETAR, águas residuais tratadas para a lavagem de equipamentos e rega das áreas ajardinadas internas às duas infraestruturas. Esse tipo de aproveitamento de águas residuais tratadas, embora habitual em muitas empresas do setor, tem contudo uma dimensão pouco significativa, em face do volume total do efluente tratado.
A perspetiva de fornecimento de água residual tratada para reutilização na agricultura, bem como para outros fins, como rega e limpeza urbana, explica os objetivos deste projeto.
“Interessa ter presente a ausência, para já, de um modelo que enquadre a componente financeira dos processos de reutilização que as orientações europeias e nacionais pretendem alavancar. Esta situação suscita a necessidade de promover uma discussão alargada dos custos que se colocam a todas as entidades potencialmente envolvidas, tanto do lado da produção – as entidades gestoras de ETAR – como da procura” observa a equipa de investigadores.
O projeto requer, também por isso, que se “aprofunde a discussão de modelos económicos a adotar com vista à cobertura dos custos adicionais associados às potenciais finalidades de reutilização de águas residuais tratadas”.
Ana Santiago
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