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Parecer da Procuradoria- -Geral da República dá razão ao regulador na guerra com Ministério do Ambiente
O parecer emitido pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o despacho do Ministério do Ambiente a entregar o exclusivo do negócio dos resíduos orgânicos à empresa EGF, do Grupo Mota-Engil, vem tirar a razão a João Matos Fernandes e confirmar os argumentos apresentados pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR).
No documento, a que o Expresso teve acesso, lê-se que “a recolha seletiva de biorresíduos representaria uma modificação substancial do objeto da concessão”, assinada aquando da privatização da empresa, em 2014, e que tal é “não aco- modável num entendimento das normas amigas da concorrência”. Os conselheiros sublinham que “o legislador não desejou incluir os biorresíduos” na concessão, já que não ignorava o conceito, e arrasam a tentativa de o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, retirar independência e competências à ERSAR para a aprovação de tarifas e de investimentos das entidades do sector, lembrando que “a base dos ativos regulados é fixada pelo regulador”.
O parecer solicitado à PGR pelo gabinete do ex-secretário de Estado do Ambiente, João Ataíde (que esteve no Ministério seis meses antes de ser substituído no novo Governo), foi emitido a 23 de outubro, mas só esta semana o ministro do Ambiente anunciou a revogação do despacho.
João Matos Fernandes garante que não vai “insistir numa solução que levanta legítimas dúvidas jurídicas” e que terá de “redesenhar em três meses um novo modelo para a recolha seletiva de biorresíduos”. Porém, continua a insistir que “seria muito mais racional e mais barato” apostar no exclusivo da EGF, porque isso facilitaria o acesso a verbas do Programa Operacional de Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR) e permitiria cumprir as metas de reciclagem de 50% em 2020 e 65% em 2035. No seu entender, “é uma irracionalidade” cada um dos 308 municípios abrir uma candidatura.
Já a PGR não vê irracionalidade alguma no facto de “os municípios poderem ser responsáveis por candidaturas a avisos abertos do POSEUR para fins de investimento na atividade de recolha seletiva de biorresíduos”.
Atualmente, os biorresíduos (restos de alimentos crus ou cozinhados ou de jardins que podem ser valorizados como fertilizantes) são recolhidos de forma indiferenciada pelas autarquias ou por outras entidades por estas concessionadas, mas a partir de 2024 têm de ser recolhidos sele- tivamente, como o são o plástico, o papel ou o vidro.
Para a ERSAR, o despacho em causa representava “um privilégio restritivo da concorrência” a uma empresa que já detém o monopólio dos resíduos urbanos e que ficaria com mais uma fatia de 40% dos resíduos urbanos, o que criaria “situações de injustiça face aos municípios”, e por isso fez uma participação ao Ministério Público, que ainda está em aberto no Tribunal Central Administrativo Sul.