Sector deve falhar metas em 2019. Preocupada com efeitos ambientais, Zero denuncia incumprimento à União Europeia
Portugal corre o risco de não cumprir as exigentes metas de recolha e encaminhamento para reciclagem de 65% dos resíduos de equipamentos eléctricos e electrónicos este ano. O problema não é de agora, e perante as evidências de graves problemas neste fluxo de resíduos, detectadas pela própria Inspecção Geral do Ambiente (IGAMAOT), já em 2017, e que incluem falhas no tratamento de alguns componentes perigosos, como os gases usados nos frigoríficos, a associação ambientalista Zero enviou uma queixa à União Europeia, esperando que a Comissão inste Portugal a arrepiar caminho.
Portugal tem três entidades sem fins lucrativos dedicadas à gestão (EG) destes resíduos, que cobram um eco- valor aos produtores de equipamentos e organizam os seus próprios circuitos de recolha mas que dependem também de resíduos encaminhados pela autarquias ou pelos Sistemas de Gestão de Resíduos Urbanos.
Pelo meio, há operadores contratados para separar e dar bom seguimento aos diferentes componentes. O sistema é complexo e, quer pelo que se percebe nos dados fornecidos à Zero pelas EG, quer pelos resultados da auditoria da IGAMAOT em 2017, cujo resumo está disponível no site deste organismo, enferma de debilidades. E não existe um efectivo controlo por parte da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), insistem os ambientalistas, reiterando críticas feitas na auditoria de há dois anos.
Tudo seria perfeito se, de nossas casas, frigoríficos, computadores, lâmpadas e outros objectos do nosso quotidiano seguissem, no fim da sua vida útil, o caminho esperado, com separação de componentes perigosos, respectiva destruição em segurança e reciclagem de materiais, como metais e plásticos, mas o problema é que não só a recolha está longe dos números a que o país se comprometeu, como, pelo meio, se percebe que há operadores contratados pelas três entidades responsáveis – a ERP, a Electrão e, mais recentemente, a WeeeCycle -que,cobrando menos, fazem um trabalho de “sucateiro”, para recorrer a uma expressão usada pelo próprio secretário de Estado do Ambiente, João Ataíde, e assumem, nalguns casos, não separar esses componentes, como a lei prevê.
O caso dos frigoríficos e outros equipamentos de refrigeração é paradigmático. Fruto de muita informalidade, e de um mercado paralelo de componentes como o cobre, e outros, só uma pequena parte destes chega intacto às EG. Pelo caminho, desaparecem, por exemplo, compressores, e não é dado o tratamento adequado aos respectivos gases, que se hoje têm menos impacto na camada de Ozono, continuam, alerta Rui Berkemeier, da Zero, a ter um grande contributo para o aquecimento global. O especialista em resíduos nota que Portugal está a encaminhar correctamente apenas 10% desses gases.
“Em 2017, Portugal tinha de cumprir um objectivo de recolher e tratar 45% dos REEE, mas as evidências obtidas através da avaliação da Zero e da auditoria da IGAMAOT apontam para que muitos desses resíduos ou foram tratados em condições inaceitáveis, sem remoção das componentes perigosas, ou nem sequer entraram nas unidades de tratamento”, assinala a Zero, chamando a atenção para o facto de a auditoria ter detectado discrepâncias entre as quantidades de resíduos tratados declarados à APA por alguns operadores e as quantidades, menores, que estes declararam às EG.
Além da auditoria “arrasadora” da IGAMAOT, a Zero suportou a sua queixa à UE num extenso relatório, construído com respostas de várias entidades do sistema, e que lhe permitam perceber que, de facto, há quem esteja a lidar com este tipo de resíduo sem separar e encaminhar o que nele é considerado perigoso, sem que se conheçam penalizações por isso. Numa intervenção num seminário dedicado a este tipo de resíduos, o secretário de Estado do Ambiente, João Ataíde das Neves, assumiu uma nova postura, prometendo regras mais apertadas na emissão de licenças e punições graves, que podem ir até à cassação das autorizações, para empresas que não cumpram as regras. O PÚBLICO questionou o Ministério do Ambiente que, porém, não respondeu em tempo útil.