Professor de Desenvolvimento Sustentável e Políticas de Saúde na Universidade de Columbia, é diretor do Centro para o Desenvolvimento Sustentável de Columbia e diretor da rede de soluções para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas
PROJECT SYNDICATE
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A solução para as alterações climáticas induzidas pelo homem está finalmente à vista. Graças aos rápidos avanços nas tecnologias energéticas sem emissões de carbono e nos sistemas alimentares sustentáveis, o mundo pode acabar com as emissões de gases de efeito de estufa até meados do século, com poucos custos acrescidos (ou mesmo nenhum), e com benefícios decisivos para a segurança e a saúde. O principal obstáculo é a inércia: os políticos continuam a favorecer a indústria de combustíveis fósseis e a agricultura tradicional, sobretudo por ignorância ou por interesse.
A maior parte do aquecimento global e uma grande parte da poluição do ar resulta da queima de combustíveis fósseis: carvão, petróleo e gás. A outra grande fonte de destruição ambiental é a agricultura, incluindo a desflorestação, o uso excessivo de fertilizantes e as emissões de metano do gado. O sistema de energia deve mudar dos combustíveis fósseis altamente poluentes para fontes de energia limpas, sem emissões de carbono, como a energia eólica e solar, e o sistema alimentar deve mudar de grãos e gado para produtos mais saudáveis e nutritivos. Essa transformação combinada da energia e dos alimentos faria com que as emissões líquidas de gases de efeito de estufa caíssem para zero em meados do século e se tornassem depois negativas, já que o dióxido de carbono na atmosfera é absorvido pelas florestas e solos.
Atingir emissões líquidas zero em meados do século, seguidas de emissões negativas, asseguraria provavelmente a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C em relação à temperatura pré-industrial. De forma alarmante, o aquecimento já atingiu 1,1°C e a temperatura global está a aumentar cerca de 0,2°C por década. É por isso que o mundo deve atingir emissões líquidas zero em 2050, o mais tardar. A mudança para a energia limpa evitaria centenas de milhares de mortes por ano causadas pela poluição do ar, e a mudança para dietas saudáveis e ambientalmente sustentáveis poderia prevenir cerca de dez milhões de mortes por ano.
Uma mudança de baixo custo para a energia limpa é agora viável para todas as regiões do mundo, devido à descida acentuada dos custos da energia solar e eólica, e aos avanços no armazenamento de energia. Os custos totais do sistema de energia renovável, incluindo transmissão e armazenamento, são agora mais ou menos equivalentes aos dos combustíveis fósseis. No entanto, os governos continuam a subsidiá-los, como resultado do lóbi incessante das grandes empresas do setor e da falta de planeamento para alternativas renováveis.
O passo fundamental é um aumento massivo na geração de energia a partir de fontes renováveis, principalmente eólica e solar. Alguns usos de energia, como o transporte de automóveis e o aquecimento doméstico, serão diretamente eletrificados. Outros – indústria, navegação, aviação e transporte de mercadorias em camiões – serão feitos com combustíveis limpos produzidos por eletricidade renovável. Os combustíveis limpos (sem emissões) incluem hidrogénio, líquidos sintéticos e metano sintético. Ao mesmo tempo, as quintas devem mudar para a produção de alimentos vegetais.
A construção continuada de centrais de carvão na Ásia, juntamente com a desflorestação em curso no sudeste da Ásia, África e Brasil, está a colocar riscos enormes e desnecessários ao nosso clima, ar e nutrição. Nos Estados Unidos, a promoção dos combustíveis fósseis pela administração Trump, apesar do vasto potencial de energia renovável da América, acentua ainda mais esta situação absurda. Assim como o renovado apelo do novo presidente populista do Brasil, Jair Bolsonaro, para se desenvolver – ou seja, desflorestar – a Amazónia.
Perante isto, o que fazer?
O passo mais urgente agora é educar governos e empresas. Os governos nacionais devem preparar avaliações técnicas do potencial dos seus países para acabar com as emissões de gases de efeito de estufa até meados do século. E empresas e bancos devem analisar urgentemente os fortes argumentos tecnológicos a favor da adoção de sistemas de energia e alimentos limpos e seguros.
Um novo estudo mostra que todas as regiões do mundo têm potencial eólico, solar e hidroelétrico suficiente para descarbonizar o sistema energético. Os países em latitudes mais altas, como os EUA, o Canadá, os países do norte da Europa e a Rússia, têm mais disponibilidade de vento do que os países tropicais. Todos os países podem mudar para carros elétricos e usar os novos combustíveis limpos nos camiões, navios, aviões e fábricas.
Esta transição energética criará muito mais empregos do que aqueles que serão perdidos no setor dos combustíveis fósseis. Acionistas de empresas como a ExxonMobil e a Chevron, que se recusam a reconhecer a transição energética que se aproxima, acabarão por pagar um preço elevado. Os seus investimentos atuais em combustíveis fósseis serão ativos perdidos nos próximos anos.
Os governos e as autoridades responsáveis pelos serviços públicos devem exigir que todas as novas instalações de geração de energia sejam descarbonizadas. A medida que as antigas centrais de combustíveis fósseis envelhecem e são desativadas, devem ser substituídas por geração de energia limpa numa base competitiva, por exemplo, através de leilões de energia renovável. A China e a índia, em particular, deviam parar de construir novas centrais termoelétricas alimentadas a carvão dentro do seu território, e países exportadores de capital como a China e o Japão deviam parar de financiar novas centrais a carvão no resto da Ásia, como no Paquistão e Filipinas.
As empresas do setor privado vão competir intensamente para reduzir ainda mais os custos dos sistemas de energia renovável, incluindo geração de energia, armazenamento de energia e o seu uso final em veículos elétricos, aquecimento e preparação de alimentos com equipamentos elétricos e a nova economia do hidrogénio. Os governos devem estabelecer limites para as emissões e o setor privado deve competir para oferecer soluções de baixo custo. E os governos e as empresas, juntos, devem financiar novas iniciativas de investigação e desenvolvimento para reduzir ainda mais os custos.
O mesmo se aplica ao uso da terra. Se Bolsonaro acredita realmente que vai impulsionar a economia do Brasil permitindo uma maior desflorestação da Amazónia para o cultivo de soja e a criação de gado, tem de pensar duas vezes. Esse esforço isolaria o Brasil e forçaria as grandes empresas do setor alimentar a deixarem de comprar produtos brasileiros devido à ameaça de uma reação negativa por parte dos consumidores a nível global.
A indústria dos alimentos já vai noutra direção. A grande notícia é que a Burger King, numa nova parceria com a Impossible Foods, está a caminhar no sentido de mudar os seus produtos para hambúrgueres vegetais, de plantas. Os hambúrgueres da Impossible Foods têm o mesmo sabor a carne, mas o uso inteligente da química permite que os amantes de hambúrgueres saboreiem a sua refeição ao mesmo tempo que salvam o planeta.
Com a transformação dos nossos sistemas energéticos e alimentares, podemos desfrutar de energia de baixo custo e dietas saudáveis e satisfatórias, sem arruinar o meio ambiente. Os jovens que se manifestaram pela segurança climática já fizeram o seu trabalho. Políticos como Trump e Bolsonaro precisam de fazer o deles ou desimpedir o caminho.
Podemos desfrutar de energia de baixo custo e dietas saudáveis e satisfatórias, sem arruinar o meio ambiente.
Jeffrey D. Sachs