Publico Projecto legislativo obriga milhares de entidades a analisarem os solos, mas descontaminação só será exigida três a cinco anos depois Ministério quer criar certificados de despoluição para a venda de terrenos Ambiente Um projecto legislativo governamental poderá obrigar os vendedores de terrenos antes ocupados por actividades, como indústrias ou postos de abastecimento, a demonstrarem se os solos estão ou não contaminados. Milhares de entidades, de empresas a autarquias, serão chamadas a fazer uma avaliação do estado dos solos. Mas a legislação, se o projecto for adiante, só resultará em acções efectivas de despoluição três a cinco anos depois de aprovada. Um decreto-lei e uma portaria, ainda numa fase inicial de discussão, pretendem pôr um ponto final em quase duas décadas de promessas de que Portugal teria uma lei para os solos contaminados. Ambos foram colocados em consulta pública no princípio do mês, num processo lançado pela Agência Portuguesa do Ambiente e que se estende até 14 de Outubro. O passo seguinte só será tomado pelo próximo Governo. Segundo o projecto, uma série de sectores industriais será chamada a cumprir um longo percurso de avaliações, com várias fases, destinadas a identificar e remediar áreas contaminadas. O mesmo vale para os postos de abastecimento, para os municípios com antigas lixeiras encerradas, para empresas do sector dos resíduos e para instituições militares. Serão milhares de operadores ou entidades. Só os postos de abastecimento são cerca de 2800, segundo dados da Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas. Cada operador terá um ano para fazer uma avaliação preliminar do risco de contaminação do solo representado pela sua actividade. Se o risco for considerado médio ou elevado, terão de ser feitas análises detalhadas para saber se os terrenos onde se centra a actividade estão ou não poluídos. Se estiverem, o operador será obrigado a limpar tudo, às suas custas. Os prazos máximos previstos entre cada uma das fases implicam que da aprovação dos diplomas até à re- mediação dos locais contaminados podem passar de três anos e dois meses a cinco anos e três meses. O tempo poderá ser maior e os prazos prorrogados, prevê o diploma. “Uma das coisas que mais preocupam são os tempos de aplicação da lei”, comenta Rui Berckmeier, da associação ambientalista Quercus. Dar prova de terreno limpo O projecto legislativo contempla algo que vem sendo sugerido há muito por profissionais e associações da área ambiental: a apresentação, para efeitos de registo predial, de uma “declaração de risco de contaminação do solo” ou de um “certificado da qualidade do solo”. Será obrigatória também a prova de que o terreno está limpo sempre que se queira urbanizar ou dar uso agrícola a zonas com uso industrial. O objectivo é evitar os riscos para a saúde provocados pela exposição a poluentes no solo, algo que nunca foi alvo de uma política nacional efectiva em Portugal. O tema assumiu particular protagonismo durante a construção do Parque das Nações, na década de 1990, numa zona de Lisboa com forte contaminação industrial. Sem legislação na altura, adoptaram-se normas canadianas de contaminação dos solos, que até hoje são utilizadas como referência. Outros países europeus adoptaram legislação própria, mas Portugal, apesar das promessas de sucessivos governos, ainda não o fez. “No mínimo, estamos atrasados dez anos”, afirma Carlos Costa, da empresa Egiamb, especializada em projectos de descontaminação. Carlos Costa diz que o projecto legislativo seguiu praticamente à risca as mesmas normas canadianas e que isto pode resultar em problemas. Em Portugal, explica o especialista e ex-professor da Universidade Nova de Lisboa, os níveis naturais de arsénio no solo, por exemplo, são maiores do que no Canadá. Por isso, algumas zonas podem parecer poluídas à luz dos valores da legislação, sem que esta contaminação tenha a ver com uma actividade industrial. Costa diz ainda que o rol de sectores abrangidos pelo projecto legislativo não é suficientemente abr