Ambiente Online Embora seja pouco conhecido, as entidades gestoras de fluxos específicos de resíduos são financeiramente penalizadas quando não atingem os objetivos de recolha a que se encontram legalmente obrigadas. Esta sanção tem vindo a ser anualmente aplicada através da Taxa de Gestão de Resíduos (TGR), cujo montante é agravado em proporção do insucesso. Não obstante, quando existem duas ou mais entidades gestoras concorrentes num determinado fluxo de resíduos, o incumprimento de uma (quantidade recolhida, cobertura geográfica, etc.) tem invariavelmente impacto na atividade da outra, que acaba por não ser ressarcida pelo esforço adicional a que se vê obrigada (a TGR é receita exclusiva do Estado, não sendo canalizada para a entidade gestora cumpridora). Esta situação é um importante elemento de distorção da concorrência, pois trabalho acrescido traduz-se normalmente em agravamento do ecovalor cobrado (em certas circunstâncias, a incumpridora poderá por esta via conseguir cobrar ecovalores mais baixos). Para solucionar este desequilíbrio, foi pela primeira vez introduzido no normativo nacional de resíduos, via diploma dos Resíduos de Equipamentos Elétricos e Eletrónicos (REEE, DL 67/2014), o princípio da compensação entre entidades gestoras – “Sempre que uma entidade gestora assume a responsabilidade pela gestão de REEE da competência de outra entidade gestora, por referência à respetiva quota de mercado, aquela tem direito a ser compensada“. Aplaudo esta decisão, pois considero que este princípio é determinante para garantir um quadro concorrencial claro e estável, devendo agora ser alargado a todos os fluxos de resíduos onde atuem mais do que uma entidade gestora. Aliás, tudo indica que esta é a intenção do MAOTE, dado que os projetos das novas licenças de várias entidades gestoras também preveem tal mecanismo. No entanto, em minha opinião, esta iniciativa é ainda assim merecedora de alguns reparos, tanto quanto à forma como quanto ao conteúdo. Em primeiro lugar, nos casos atrás referidos foi imputado às entidades gestoras o ónus de criarem e gerirem o organismo que se encarregará de tomar estas decisões compensatórias, a chamada câmara de compensação. Temo que esta opção seja de muito difícil aplicação prática, devido à relação de proximidade com os afetados/beneficiários das sanções. Do meu ponto de vista, uma melhor alternativa seria a criação de um organismo independente tanto das entidades gestoras como dos produtores/importadores, com supervisão/participação direta do MAOTE e isenção inatacável. Esta solução teria também a vantagem de permitir acumular competências em vários fluxos de resíduos, prevenindo aquilo que prevejo que possa vir a acontecer num futuro próximo – a existência de tantas câmaras de compensação quantos fluxos de resíduos específicos. Por outro lado, ainda quanto à forma, penso que existe necessidade de consagrar na legislação quadro e nas sectoriais as normas orientadoras deste mecanismo, devido à sua relevância, impacto financeiro e previsível âmbito alargado. No caso dos REEE tal foi concretizado, mas nos outros fluxos ainda não aconteceu (apesar de, como atrás referido, já se encontrar vertido em vários projetos de licenças conhecidos). Já no que diz respeito ao conteúdo, é incompreensível a omissão da participação dos sistemas individuais (geridos por um único produtor) nos mecanismos de compensação, dado que há casos em que estes têm uma quota de mercado com alguma expressão e as suas responsabilidades ambientais são idênticas às dos sistemas colectivos. Uma última nota para outra competência que o legislador decidiu atribuir à câmara de compensação dos REEE, a “alocação de recolhas aos sistemas de gestão individuais e coletivos”. Também esta me parece trata-se de uma matéria muito delicada para ser decidida neste âmbito e com este contexto funcional, preferindo que as regras que regulam a atividade das entidades gestoras fossem exclusivamente definidas nas suas licenças. Em conclusão, penso que estamos perante uma excelente decisão por parte do MAOTE em matéria de política de gestão de resíduos, ainda que careça de alguns ajustes conceptuais. Ricardo Furtado é desde 2004 director-geral da VALORCAR. Anteriormente foi assessor do Secretário de Estado do Ambiente d