Expresso Diogo Faria de OliveiraSeja qual for a data para o desfecho do processo da Empresa Geral de Fomento (EGF), o corrente ano já ficou historicamente marcado pela decisão de reprivatização e pelo processo (complexo e pouco consensual) da sua alienação. Esta decisão, que tem muito mais virtudes e benefícios do que inconvenientes, implicou uma série de alterações legislativas que têm vindo a ser aplicadas, algumas já durante o processo de alienação, e que ainda não estão totalmente concluídas.O diploma legislativo publicado mais recentemente é o D.L. n° 96/2014, de 25 de junho, que estabelece o regime jurídico da concessão da exploração e da gestão, em regime de serviço público, dos sistemas multimunicipais de tratamento e de recolha seletiva de resíduos urbanos, atribuída a entidades de capitais exclusiva ou maioritariamente privados (nova lei de bases das concessões).A primeira leitura desta nova lei de bases que coexistirá com o D.L. n° 294/94, de 16 de novembro, que se aplica exclusivamente ao sector público obriga a destacar imediatamente a importância dada ao cumprimento dos objetivos de serviço público no exercício da atividade concessionada (universalidade no acesso, continuidade, qualidade e eficiência de serviços).É igualmente de sublinhar a importância deste diploma como instrumento para o cumprimento das novas metas ambientais inscritas no Persu 2020 (Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos), ao obrigar a concessionária a adaptar a sua atividade ao cumprimento daquelas metas.Assim, se dúvidas houvesse, elas estão claramente esclarecidas: o futuro operador privado prestará sempre um serviço público!Não obstante, a nova lei de bases é criticável dado que não esclarece se as atividades das concessionárias, ao nível da tipologia dos resíduos, apenas podem ter por objeto a recolha e tratamento de resíduos urbanos.É que, de acordo com a nova lei de bases, a concessionária pode exercer atividades que sejam consideradas “complementares”. De facto, a manutenção das definições (menos felizes) do regime geral da gestão de resíduos pode continuar a permitir a sobreposição das tipologias de resíduos urbanos e resíduos industriais, sobretudo, sempre que estejam em causa resíduos que, pela sua natureza ou composição, sejam semelhantes aos produzidos por habitações ainda que o seu produtor seja um operador económico (indústrias, comércio ou serviços).Ora, num momento histórico para a gestão dos resíduos urbanos perdeu-se uma oportunidade de alterar as definições legais de resíduo industrial e resíduo urbano. Permanece assim uma zona de sobreposição que a ninguém beneficia entre resíduos urbanos, resíduos industriais e os ditos resíduos equiparados a urbanos. O sector dos resíduos urbanos pode, deste modo, continuar a beneficiar de uma vantagem competitiva significativa em relação aos operadores de resíduos industriais, sustentada por um mercado que, apesar de regulado, continuará a ser exclusivo.É criticável também a introdução na nova lei de bases da definição, inédita, de ‘Resíduos urbanos de grandes produtores’, sobretudo, quando apenas é referida como definição, não surgindo ao longo do diploma em nenhuma disposição. A introdução desta definição legal vem adensar a possibilidade de sobreposição das tipologias de resíduos industriais e urbanos.Não estando ainda totalmente fechado o quadro legal respeitante à gestão de resíduos urbanos, aguardamos com expectativa que os próximos diplomas venham esclarecer estas (in) definições.Presidente da direção da AEPSA Associação das Empresas Portuguesas para o Sector do Ambiente