Família Cristã Dizem que pode ser a causa de uma próxima grande guerra mundial. A água é cada vez mais um bem escasso e, por isso, altamente valioso. E mesmo sendo este um cenário catastrófico, a verdade é que quando o tema é água potável todos têm alguma coisa a dizer.Em Portugal, o sector dos serviços da água está a sofrer a maior reestruturação de sempre. A crise – e a troika – obrigou o Governo português a repensar a forma como este está estruturado. Um processo que está em curso mas que, ainda assim, é lento e pouco unânime.0 primeiro passo foi dado em finais de janeiro quando a proposta do Executivo para a concessão do abastecimento de água e saneamento a privados foi aprovada no Parlamento pelo PSD e CDS-PP. A proposta de lei «viabiliza a concessão de sistemas multimunicipais de resíduos sólidos urbanos a entidades de capitais maioritária ou totalmente privados e a subconcessão de sistemas multimunicipais de águas e de saneamento de águas residuais a entidades de natureza também privada». Ora, de um modo geral, pode dizer-se que a primeira grande discussão é, exata- mente, estas duas palavras: concessão e subconcessão. Para uns, são coisas bem diferentes, para outros, é tudo o mesmo.Um sector endividado. A insustentabili- dade económica e financeira do sector das águas foi a razão principal para que o Governo pusesse em marcha o processo de reestruturação da Águas de Portugal (AdP). Os números parecem não deixar dúvidas quanto a esta questão: o endividamento total do grupo AdP ficou-se em três mil milhões de euros no final de 2012, sendo que o volume de dívidas de clientes às empresas do grupo era superior a 555 milhões de euros.Posto isto, o ministério de Assunção Cristas, à data ministra do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território – depois deste “verão quente” ficou apenas com a pasta da Agricultura e do Mar, tendo Moreira da Silva assumido o Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, e assume também agora este processo do sector das águas -, apresentou a proposta de lei descrita em cima. De acordo com o Governo, a Empresa Geral de Fomento (EGF), a empresa pública que gere os resíduos no universo AdP, deve seguir o caminho da privatização total, com conclusão prevista para o primeiro semestre do próximo ano.Já no que diz respeito à água e ao saneamento, «prevê-se a reorganização, sem alteração da natureza ^ das entidades gestoras, que permanece maioritariamente pública», esclarece o Ministério do Ambiente. Assim, nas águas e esgotos, o Governo acredita que «a linha de atuação projetada assenta na promoção do equilíbrio tarifário, na resolução dos défices tarifários e na implementação de estratégias de integração vertical dos sistemas municipais, mas também na agregação dos sistemas multimunicipais existentes, os quais podem ser subconcessionados, total ou parcialmente, a empresas cujo capital seja integral ou maioritariamente subscrito por entidades do sector privado». E é neste ponto que o Governo insiste em que não sejam feitas confusões.Quanto às vantagens que a proposta de lei apresenta, nem todos acreditam que se possam tornar realidade.Dúvidas e questões. Uma das entidades a levantar algumas dúvidas sobre a eficiência desta proposta governamental é a Quercus. Carla Graça, vice-presidente da direção nacional e coordenadora do grupo de trabalho da água da associação ambientalista, assume que as dúvidas em relação ao modelo do Governo se prendem, por um lado, «com a questão de as entidades (públicas, normalmente os municípios) que concessionam os sistemas não terem um bom conhecimento das suas infraestruturas e do seu património, desconhecendo, por isso mesmo, osinvestimentos que são necessários e não os prevendo nos contratos de concessão».Por outro lado, «a questão da dimensão apontada para os sistemas a agregar». Neste momento, o Governo prevê a constituição de quatro grandes sistemas, através da fusão de 19 empresas que constituem atualmente o sector dos serviços de abastecimento de água e de saneamento do universo AdP.Ora, Carla Graça considera que a agregação dos sistemas, quer horizontalmente, isto é, agregando vários sistemas já existentes a nível regional, juntando sistemas com mais escala – ou seja, com mais habitantes – a sistemas mais pequenos; quer verticalmente, ou seja, juntando a alta (captação) que está a cargo dos sistemas multimunicipais do grupo AdP, e a baixa (distribuição aos consumidores), que normalmente está a cargo dos municípios ou de entidades concessionárias, «pode ajudar a corrigir assimetrias, a ganhar economias de escala e a aumentar a eficiência dos sistemas». No entanto, «as nossas dúvidas têm a ver com a dimensão apontada para estes sistemas. O grupo AdP e o Governo têm falado em quatro grandes sistemas – um deles, o de Lisboa e VaLe do Tejo, que abrange 99 municípios, que vão da Grande Lisboa à zona do Vale do Côa! – e temos dúvidas na eficiência da gestão destes sistemas», explica a responsável da Quercus.