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Do uso de inteligência artificial no licenciamento ambiental, a mais apoios para as famílias na eficiência energética das suas casas, até ao reforço do investimento em redes elétricas e à criação de uma estratégia de armazenamento até 2026, este é o caderno de encargos do Governo na trasição climática e energética.
“É necessário tornar mais eficazes os procedimentos de licenciamento ambiental, com reforço da necessária transparência e fiscalização, introduzindo também maior inovação e digitalização de processo”, reconhece o programa do Governo que foi apresentado esta quarta-feira na Assembleia da República.
Depois de algumas desistências de grandes investidores internacionais – a Orsted desistiu de ir a jogo no leilão de energia eólica offshore que deverá acontecer este ano em Portugal, enquanto a Engie e a Shell deixaram cair o projeto de criação de um corredor marítimo de hidrogénio entre Sines e Roterdão -, o novo Executivo de Luís Montenegro vem agora dizer no seu programa de Governo que “importa criar condições para que projetos no domínio das energias renováveis possam ter uma concretização célere e efetiva , mas sempre garantindo a racionalidade e competitividade económica”.
E avisa que é necessária “uma adequada ponderação das opções a tomar ao nível da transição energética, garantido a total e absoluta transparência e escrutínio para assegurar que Portugal não envereda, irresponsável e levianamente, por investimentos de questionável racionalidade ambiental e/ou económico-financeira com elevados custos para o país e hipotecando gerações futuras” . O programa do Governo não explica, no entanto, quais são os investimentos “questionáveis” a que se refere”.
“Há que assegurar a necessária estabilidade regulatória e previsibilidade aos investimento. Neste âmbito, importa garantir que os procedimentos se tornam mais ágeis, eficazes e desburocratizados. O Governo pretende reforçar a capacidade de resposta das instituições envolvidas nestes procedimentos”, diz o documento, referindo-se a entidades como a Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG), a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) ou o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
Programa AIA 2.0. Governo quer IA no licenciamento ambiental
Para isso, o Governo diz que irá criar o Programa de Modernização da Avaliação de Impacte Ambiental – AIA 2.0, com recurso a tecnologias de inteligência artificia l para maior transparência e celeridade das decisões. Além disso, quer também implementar um Portal Único do Licenciamento “com vista a assegurar a total transparência e integridade dos processos de licenciamento, com a digitalização integral dos processos”.
Montenegro promete também dar um n ovo impulso à Reforma da Fiscalidade Verde e premiar os municípios que mais contribuem para o cumprimento dos objetivos ambientais . Reconhecendo que estão ainda por regulamentar e implementar diversos aspetos da Lei de Bases do Clima, o Governo, “o que coloca em risco a sua aplicação efetiva”, o Governo prevê “imprimir uma maior dinâmica a esta área governativa”.
Até junho, uma das principais tarefas passará pela revisão do Plano Nacional Energia e Clima (PNEC 2030, cuja versão final terá de ser entregue a Bruxelas) e da Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC). Mas também assegurar a operacionalização dos Mercados Voluntários de Carbono incentivando projetos de redução de emissões de gases com efeito de estufa e também projetos de sequestro de carbono.
Quanto à energia, o programa do Governo diz que “é necessário que Portugal tenha uma nova política e uma nova governação”, assegurando que vai reduzir os custos energéticos dos portugueses, tendo como meta “alcançar preços inferiores aos da média da UE para a indústria e consumidores em geral” . Para baixar os preços para as famílias e empresas, Montenegro propõe incentivar o aparecimento de novos agentes de mercado, garantir processos concorrenciais transparentes, regras claras de horizonte temporal alargado, menos burocracia e mais eficiência nos procedimentos”.
Quanto aos mercados regulados, na eletricidade e gás, o Executivo diz que podem ter um papel relevante de backup para situações de inacessibilidade e para garantia de estabilidade económica, em benefício dos consumidores.
No que diz respeito à eficiência energética e ao combate à pobreza energética, o documento diz que, independentemente do mérito de programas como o Vale Eficiência ou o Programa Edifícios mais Sustentáveis, “serão adotadas novas medidas e iniciativas para a racionalidade dos consumos energéticos no parque habitacional” e reforçados os programas de apoio dirigidos à habitação.
Outra prioridade passa pela promoção de investimento economicamente racional e execução efetiva das redes e infraestruturas de transporte e distribuição de eletricidade e gás” . Isto tendo em conta a maior penetração das renováveis e descentralização da produção.
“Há uma grande complexidade no planeamento, desenvolvimento e funcionamento das redes energéticas. É fundamental que os processos sejam eficazes, claros e assertivos”, sublinha o programa, defendendo um melhor planemaneto capacidade de receção das redes de distribuição e de transporte “de modo a acomodar o aumento de produção de fonte renovável face aos estrangulamentos existentes”. O Governo compromete-se a concretizar os compromissos assumidos entre Portugal, Espanha e França ao nível das interligações energéticas para aumentar a conectividade europeia.
E diz que vai rever o enquadramento legislativo referente aos planos de desenvolvimento e investimento nas redes energéticas nacionais para serem mais eficazes ao nível da sua revisão e aprovação.
No armazenamento de energia, Montenegro quer reforçar a capacidade do país, “seja ao nível da eletricidade ou dos gases renováveis”, através da c riação de uma Estratégia Nacional de Armazenamento de Energia até 2026. “O objetivo será acelerar o investimento na capacidade nacional de armazenamento através de baterias associadas a parques eólicos e fotovoltaicos”, refere. Será ainda estimulado o “conceito de consumidor-produtor, desburocratizando e acelerando o licenciamento das formas de produção descentralizada, bem como a partilha de energia”.
No que diz respeito ao défice tarifário, que em 2024 teve um novo aumento expressivo, o Governo promete “adotar políticas públicas que reconduzam Portugal a uma tendência de descida no défice tarifário”.
“Especial atenção” à seca no Algarve e Alentejo
No que diz respeito à água, “um recurso cada vez mais estratégico”, e tendo em conta a redução da disponibilidade hídrica e a ocorrência mais frequente de situações de seca no país, o Governo quer garantir que Portugal continua a ter água nas torneiras de norte a sul. “O Governo dará especial atenção ao problema da seca no Algarve e no Alentejo”, promete Montenegro.
“A ação governativa apostará na eficiência hídrica e na modernização do setor, conjugando medidas ao nível do planeamento, legislação, financiamento, inovação e sensibilização dos setores e dos cidadãos para o uso sustentável da água”, diz o programa do Governo, reconhecendo as “enormes necessidades de investimento na reabilitação de infraestruturas”.
Da lista de prioridades destaca-se: o Programa de Ação para a Digitalização Integral do Ciclo da Água; a revisão da Lei da Água; atualização do Plano Nacional da Água para o horizonte temporal de 2025-2040; implementação dos Planos Regionais de Eficiência Hídrica e do Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais e Pluviais 2030 (PENSAARP 2030); programas para reduzir perdas de água nas redes de abastecimento, para reforçar a capacidade de armazenamento das albufeiras e aumentar a reutilização de águas residuais tratadas; novos instrumentos de financiamento para a renovação de infraestruturas e reforço da eficiência hídrica; execução das centrais de dessalinização previstas e avaliação de novas necessidades; modernização das redes de monitorização de recursos hídricos; projeto piloto de recarga artificial de aquíferos; e aproveitamento de águas pluviais.
Nos resíduos, o Governo quer “reformar o setor e acelerar a economia circular”. ” O setor dos resíduos tornou-se mais complexo, mas também mais conflituoso e opaco, com diferentes agendas em competição , nem sempre prevalecendo o interesse público. Os resultados estão longe de serem satisfatórios, ainda que se reconheça a grande exigência das metas europeias”, assume o programa do Governo, prometendo “recuperar os atrasos e reverter os maus desempenhos ao nível da prevenção, reutilização, reciclagem e valorização”.
O Governo pretende adotar medidas, nomeadamente: garantir a implementação efetiva dos planos setoriais aprovados para o horizonte 2024-2030 (PNGR, PERSU, PERNU, PAEC) e preparar uma revisão intercalar para
introduzir alterações que garantam maior operacionalidade; atualizar a Estratégia para os Biorresíduos e criar condições para que a recolha seletiva e sua valorização seja operacionalizada em todo o território;
reestruturar o modelo de funcionamento da Comissão de Acompanhamento da Gestão de Resíduos (CAGER); implementar o funcionamento de novos fluxos específicos de resíduos em sistemas de responsabilidade alargada do produtor; adotar medidas ao nível da fiscalidade verde: