Eco online
Associações fazem balanço misto de 2022, adivinhando um 2023 exigente ao nível dos objetivos. Novo aeroporto, gestão de resíduos e implementação da Lei de Bases de Clima são prioridades. O novo aeroporto de Lisboa, a gestão de resíduos e a implementação da Lei de Bases do Clima surgem no topo das preocupações e prioridades das associações ambientalistas para 2023, que antecipam um ano exigente face ao balanço feito relativamente aos últimos 12 meses. “2022 ficou marcado pela intensificação dos fenómenos climáticos extremos. O contexto de crise climática agravado pelos constrangimentos provocados pela guerra na Ucrânia, desafiam-nos a fazer muito mais e melhor encarando as questões de fundo “, indica a Quercus. No próximo ano, abrir-se-á mais um capítulo na novela do novo aeroporto de Lisboa . Desta vez, o foco recairá sobre a realização de uma nova Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) que irá selar a localização desta a infraestrutura, tarefa que já leva meio século. Montijo, Alcochete ou Santarém são as opções em cima da mesa. Processo deverá ficar concluído em outubro de 2023. Certo é que, pelo menos, nove organizações ambientais manifestaram querer fazer parte do processo desde o princípio. E propõem que se tenham em consideração na AAE nove fatores “críticos de decisão”: a conservação da natureza e da biodiversidade; a necessidade de mitigação e adaptação às alterações climáticas; a saúde pública (ar, ruído, água) e a segurança; eficiência e capacidade de operação de tráfego aéreo; a sustentabilidade; os transportes; o ordenamento e a competitividade. “A ANP/WWF quer que o processo de decisão sobre um novo aeroporto seja transparente, participado e informado pela melhor informação disponível, e que a escolha final recaia sobre a localização que seja menos onerosa para o ambiente e saúde pública.” O ano de 2023 também será um importante para a implementação dos sistemas municipais de recolha seletiva de biorresíduos . A tarefa sugere ser um “grande desafio uma vez que representam cerca de 37% dos resíduos urbanos produzidos em Portugal” , explica a Quercus. Segundo a organização liderada por Alexandra Azevedo , será necessário adotar medidas para possibilitar a separação e reciclagem na origem dos biorresíduos , através da compostagem doméstica ou comunitária; garantir a recolha seletiva e o posterior transporte para instalações de reciclagem, “evitando a sua mistura no tratamento com outros resíduos, em particular com a fração orgânica dos resíduos indiferenciados”. Este objetivo, considera a associação ambientalista Zero, será “determinante para o cumprimento das ambiciosas metas definidas pela Comissão Europeia” e permitirá fazer a transição para uma economia “verdadeiramente circular num setor onde a produção de resíduos não tem parado de aumentar”. De acordo com a organização presidida por Francisco Ferreira, os objetivos referentes à gestão dos resíduos serão concretizados de forma mais eficaz se, em 2023, o Governo decidir recuar na decisão de juntar as Secretarias de Estado do Ambiente e da Energia . Desta forma ficará garantida “uma mais rápida e eficaz implementação dos diferentes dossiers de enorme relevância que estão na alçada de cada uma delas”. Entre eles está Em setembro, o Governo decidiu formar um grupo de trabalho que, até 31 de maio de 2023, deverá apresentar um relatório com contributos e recomendações a vários níveis, entre eles, as áreas a licitar para a instalação de parques eólicos no mar. Mas, acima de tudo, será necessário concertar esforços para a implementação da Lei de Bases de Clima, cuja implementação já vai atrasada uma vez que a legislação recebeu “luz verde” do Parlamento a 31 de dezembro e que deveria ter sido implementada até ao final deste ano. A Zero apela à urgência de uma rápida implementação para que Portugal cumpra com o compromisso de alcançar a neutralidade climática antecipadamente, em 2045. A falta de ação levou a associação ambientalista Último Recurso a avançar com uma ação judicial contra o Estado “Um dos maiores objetivos é obter a redução de emissões de gases de estufa através de decisões judiciais. Aquilo que se chama litigância climática deu agora o primeiro passo em Portugal com este processo que a Último Recurso está a iniciar”, afirmou à Lusa a presidente da organização, Mariana Gomes. “Depois da entrada em vigor da Lei de Bases do Clima, Portugal continua a esgotar o seu orçamento de carbono em 2027”, alertou Mariana Gomes, enumerando outros fundamentos para esta ação: “Várias medidas regulamentares e administrativas não foram desenvolvidas na Lei de Bases do Clima, como o conselho de ação climática . E o governo tem demonstrado que quer aumentar as emissões, com a construção do novo aeroporto ”. 2022 foi “ano cheio de boas e más notícias” Ao fim de 12 meses, as associações ambientalistas em Portugal fazem um balanço misto, frisando ter sido “um ano cheio de boas e más notícias para a conservação da natureza”. Segundo a ANP/WWF, a aprovação da legislação comunitária a nível da desflorestação, que proíbe a entrada no mercado europeu de produtos provenientes de áreas desflorestadas, e a proposta de lei de restauro da natureza no Parlamento Europeu, permitiram dar “passos significativos na proteção dos ecossistemas” , sendo esta última considerada como “ a maior peça legislativa sobre conservação da biodiversidade a nível europeu” desde 1992. “Precisamos garantir que esta lei seja aprovada, pois o restauro é uma potente ferramenta para atuar contra as crises climática e de biodiversidade, simultaneamente.” A nível da biodiversidade, as ONG salientam também o acordo alcançado na Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para a Diversidade Biológica (COP15), em Montreal, onde à conservação da natureza e biodiversidade, para os países em desenvolvimento. Mas a nível nacional também se fizeram novos avanços como, por exemplo, com a entrada em vigor da taxa sobre as embalagens de plástico para take way , à qual se seguirá uma taxa sobre as embalagens de alumínio para este mesmo fim a partir de janeiro de 2023. E do lado dos governantes foram renovadas as promessas, como a antecipação da meta nacional de ter 80% de energias renováveis na eletricidade primeiro para 2026, e depois, para 2025 , de acordo com o secretário de Estado de Energia, João Galamba . Por sua vez, António Costa também reforçou o compromisso do país em querer liderar a transição energética e a neutralidade carbónica , prometendo perante os líderes mundiais, na 27ª Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas de 2022 (COP 27), que essa meta seria alcançada a nível nacional cinco anos antes do previsto, em 2045. Os maus momentos do ano chegam quando nos recordamos da seca extrema que assolou quase a totalidade do território e a consequente escassez de água , no verão, fenómenos que obrigaram ao Governo a tomar medidas excecionais , nomeadamente e a redução do consumo em complexos turisticos, no Algarve “A forma errática como o Governo geriu a situação de seca no país com recurso a medidas avulsas e sem qualquer efeito de longo prazo evidencia a inexistência de uma estratégia política para a gestão dos recursos hídricos em Portugal capaz de responder aos desafios impostos pelas alterações climáticas e assegurando uma maior resiliência a situações de seca e escassez hídrica” Ligadas à seca e à escassez de água, surgem as “inevitáveis” consequências que resultaram dos incêndios florestais , recorda a Quercus. Segundo a organização, os fogos deste ano d estruíram mais de 110 mil hectares em Portugal continental, com 50% da área ardida em floresta e 40% em áreas de matos, em parte resultante do recorrente ciclo de incêndios. Destaque para o incêndio da Serra da Estrela, que, em duas semanas, devastou 26 mil hectares no total. “Este incêndio evidenciou mais uma vez a ineficácia das medidas em vigor nas Faixas de Gestão de Combustível, em que áreas intervencionadas meses antes com desmatação, incluindo os aceiros, não travaram a progressão do fogo, o que só aconteceu em área densamente arborizadas com folhosas caducifólias, no caso em concreto uma área dominada por castanheiros, em Manteigas” Ainda a nível nacional, as organizações referem ainda a simplificação dos licenciamentos ambientais que, embora tenha sido recebida com bons olhos pelas empresas no setor, levantou preocupações entre os ambientalistas, que consideram que a decisão “compactua com o discurso mais retrógrado de uma parte do tecido empresarial português que continua a confundir disfuncionalidades processuais com os valores inalienáveis que a regulamentação procura preservar” , aponta a associação ambientalista Zero. “Esta aprovação, que vem disfarçada de um discurso de aparente compromisso com a proteção ambiental, vem, na verdade, abrir portas para a degradação ambiental e confundir a remoção de uma burocracia com um aligeiramento das regras de proteção ambiental no nosso país.” A nível europeu, destaca-se a inclusão do gás fóssil e da energia nuclear na lista de investimentos sustentáveis da União Europeia (UE), a taxonomi a , pelo Parlamento. A medida, considerada como de maior relevância pelo executivo comunitário, fez soar os alarmes entre as organizações ambientais internacionais, como a Greenpeace, que prometeram avançar com ações jurídicas contra a Comissão Europeia. “Com este “selo verde”, estas atividades poderão receber milhões de euros que deveriam ser destinados a atividades que são, de facto, amigas do ambiente , o que levará a uma expansão destas indústrias e a consequente aumento das alterações climáticas e do aquecimento global”, alerta a ANP/WWF.