Jornal Económico Online
28/07/2022
Eduardo Marques| Presidente da AEPSA – Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente
Não chega fazer apelos reiterados para um uso mais racional e poupança de água, por parte dos cidadãos. É tempo de exigir uma gestão eficiente e responsável por parte das entidades gestoras dos serviços de abastecimento público de água. As alterações climáticas – que há poucos anos muitos responsáveis consideravam uma visão fundamentalista dos ambientalistas –chegaram rapidamente, de forma assustadora e catastrófica um pouco por todo o planeta, sendo de realçar os recordes de temperaturas na Europa e, em consequência, a seca extrema, nomeadamente em Portugal. Hoje, mais do que nunca, a água potável é o bem mais escasso do planeta e absolutamente essencial à vida. É, pois, revoltante e inadmissível assistir-se à reiterada ineficiência hídrica de muitas entidades gestoras dos serviços de água, onde o desperdício, sob a forma de perdas de água, nalguns casos ultrapassa os 50%, e a média nacional das perdas de água – perdas reais mais perdas comerciais – ronda uns vergonhosos 29%. No entanto, é de realçar que nas concessionárias privadas de gestão dos serviços de água (que servem cerca de dois milhões de portugueses), as perdas de água são em média da ordem dos 17% e algumas concessionárias têm perdas de água inferiores a 10%, em função das especificidades próprias das infraestruturas. Os dados da ineficiência, perdas de água demasiado elevadas, existem e estão disponíveis para todos, basta consultar a informação que anualmente o regulador publica sobre a maioria das entidades gestoras do país, dado que cerca de 90 % das entidades fornecem dados nesta matéria. No conjunto das entidades gestoras do setor público, embora se registe em algumas dessas entidades importantes melhorias, verifica-se na última década em média uma estagnação da ineficiência, isto é, um sistemático e elevadíssimo volume anual de perdas de água. Por outro lado, também se verifica que as entidades gestoras privadas, concessionárias dos serviços de distribuição de água em baixa, conseguiram de forma progressiva e sustentada atingir níveis de excelência na minimização de perdas de água. As empresas privadas concessionárias estão, ainda, a dar um forte contributo de redução de desperdício de água em contratos específicos de serviços de gestão integrada para redução da água não faturada, que permitiram em três contratos poupanças de água de muitos milhões de m3 nos últimos dois anos. Pode-se concluir que estes concursos, em que uma parte significativa da remuneração é efetuada em função do desempenho e incorporando uma garantia mínima de eficiência, são uma forma de se atingirem, o mais rapidamente possível, bons níveis de eficiência hídrica, já que é transferido para o prestador de serviços uma parte significativa do risco contratual. Efetivamente, no nosso país há um caminho longo e urgente para se atingirem níveis médios de eficiência hídrica aceitáveis. É preciso reduzirem-se as perdas de água, tanto perdas reais como perdas comerciais, o que se consegue facilmente, com rapidez e com a gestão adequada. Se todas as entidades gestoras públicas, em média, tivessem perdas de água equivalentes às concessionárias privadas, haveria uma economia anual de perdas reais de água de cerca de 70 milhões de m3. Isto equivale a um reservatório com uma base igual a um campo de futebol e com uma altura de cerca de quatro vezes a da Serra da Estrela, o que corresponde à quantidade de água necessária para abastecer todo o país durante cerca de 44 dias. É importante mudar mentalidades e adotar comportamentos de consumo mais responsáveis, mas não chega fazer apelos reiterados para um uso mais racional e poupança de água, por parte dos cidadãos. Está mais do que na altura de fazer um forte apelo, ou melhor, exigir, uma gestão eficiente e responsável por parte das entidades gestoras dos serviços de abastecimento público de água. Este é um grito de alerta. É urgente reduzir as perdas de água nas redes públicas. É imperativo acabar com a “montanha” da nossa vergonha.