Expresso
SIM
Alexandre Lima Geólogo e professor na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto Portugal tem o potencial para | ser um grande produtor europeu de lítio, inclusive para ser o seu maior produtor, se se conseguir aproveitar todos os minerais de lítio que existem no seu subsolo (espodumena, lepidolite, ambligonite, petalite e zinnwaldite). Para isso, além das reservas que já estão medidas nas minas até agora identificadas e à espera de aprovação da Agência Portuguesa do Ambiente, terá de haver forçosamente mais prospeção, para provar o potencial dos grandes recursos de lítio que já se conhecem na zona Norte e Centro, um processo que demora vários anos a concretizar e que culmina com as campanhas de sondagens, envolvendo milhares de análises químicas e mineralógicas. Após isso, não podemos esquecer que ainda temos de fazer os Estudos de Impacto Ambiental, que têm de ser aprovados, e obter a Licença Social para operar nas novas minas (quer sejam a céu aberto, subterrâneas ou ainda mistas) que venham eventualmente a mostrar-se economicamente viáveis. Mas só a construção de uma metalurgia de lítio em território nacional poderá reter a maior parte do seu valor dentro de fronteiras, não precisando de recorrer só à importação para fazer refinação, como se fez durante décadas com o petróleo. O facto de ter bons portos marítimos e de haver grande percentagem de energias renováveis na sua rede energética faz com que a futura metalurgia possa ser alimentada internamente por minérios do país, mas também atrair tecnicamente, quando necessário, os minérios que circulem na Rota do Atlântico, garantindo aos compradores finais dos compostos de lítio (carbonato, hidróxido ou cloreto de lítio) uma origem socialmente e ambientalmente certificada, algo que começa a ser exigido pelas principais marcas de automóveis elétricos. Pode ainda conseguir prolongar mais a cadeia de valor de lítio em Portugal, dado que a produção de compostos de lítio pode atrair os produtores de células de baterias e até a sua montagem em fábricas de baterias nacionais. Desta forma, poderá mesmo garantir a manutenção das fábricas de automóveis em Portugal, convertendo as atuais fábricas da zona Centro e Sul para produção de automóveis elétricos. No final da cadeia, não podemos ainda esquecer a reciclagem das baterias de lítio, que pode também alimentar com matéria-prima a metalurgia. Para que todo este processo descrito aconteça, tem de haver o envolvimento de muitos técnicos de geologia, engenharia de minas, biologia, ciências sociais, engenharia ambiental, arquitetura paisagista, etc.
NÃO
Francisco Ferreira, Presidente da ZERO e professor na FCT Nova É verdade que, num cenário de emergência climática em que é urgente a sociedade deixar de estar centrada no consumo de combustíveis fósseis, exige-se que todos possam contribuir para a alteração do paradigma energético. Portugal não pode recusar fazer parte da transição energética, contribuindo com o fornecimento de recursos, neste caso concreto de lítio, essencial para a tecnologia que hoje impera na eletrificação do sector dos transportes, além de garantir muitos outros equipamentos com baterias. Contudo, esta só deverá avançar se tivermos efetivamente uma exploração responsável, com baixo impacto ambiental, social e económico e em que toda a cadeia de valor, desde a exploração, passando pelas várias fases de processamento e produção de produtos finais, fica em território nacional, algo que não está claramente assegurado. Mais ainda, tem de se efetivar um esforço regulatório europeu para obrigar à reciclagem dos materiais das baterias em detrimento da ênfase na extração. São muitas as interrogações e algumas certezas que levam a dizer que Portugal não pode tornar-se um dos principais produtores de lítio do mundo. As interrogações começam logo pela disponibilidade do recurso. Os dados estatísticos mundiais para 2020 colocam Portugal em 8Q lugar em termos das grandes reservas mundiais, com 60 mil toneladas, mas de forma muito distante dos primeiros cinco classificados. O “Relatório de Avaliação Ambiental Preliminar” do Programa de Prospeção e Pesquisa nas oito áreas potenciais em lítio aponta para uma escassez de dados que permitam concluir sobre qual o valor deste recurso nas várias áreas. Acresce ainda um conjunto de fortes restrições territoriais que resultariam em impactos ambientais muito significativos sobre os valores naturais em presença, salvaguardados por compromissos internacionais, assim como geradores de impactos e conflitos com as populações, sendo inevitável uma redução da área passível de prospeção e pesquisa e eventual futura exploração avaliada. Assistimos a uma vaga de intenções de exploração que se assemelha a um fenómeno predatório de delapidação dos recursos num curto espaço de tempo. As minas em Covas do Barroso e do Romano, se avançarem, deixarão uma enorme marca na paisagem e no modo de vida das gentes locais. Devemos estar disponíveis para contribuir, mas não deveremos ir além da disponibilidade numa partilha de responsabilidades, longe de sermos um dos principais produtores de lítio do mundo hipotecando valores fundamentais para o futuro.