Jornal de Negócios
Entre 31 de outubro e 12 de novembro realiza-se em Glasgow a 26.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas. Pretende-se o acordo de todos os países para se atingir neutralidade carbónica global em 2050 e assegurar o cumprimento do limite de aumento da temperatura em 1,5 graus. Outros objetivos incluem: adaptação e proteção de comunidades e habitats naturais; mobilização de financiamento; e definição em conjunto das regras necessárias à concretização dos objetivos do Acordo de Paris (2015). Neste momento, o limite de subida da temperatura global em 1,5 graus encontra-se comprometido, impondo-se alcançar a neutralidade carbónica em 2050 a nível mundial. Para a sua concretização, a mobilização da comunidade financeira é fundamental. De acordo com estimativas da IEA (2021), o cumprimento da meta de neutralidade carbónica exigirá investimento mínimo entre 0,6 e 1% do PIB mundial (entre 12 e 20 biliões de USD) durante as próximas duas décadas. Relativamente ao contributo da indústria de gestão de ativos na promoção da transição climática, o Fundo Monetário Internacional (FMI), no “Global Financial Stability Report” publicado este mês, dedica-lhe um capítulo. Salienta-se a importância deste setor como catalisador da transição global, na medida em que fundos com mandato sustentável (ou mais especificamente ambiental) representam a evolução das preferências da comunidade de investidores, a sua avaliação de riscos e oportunidades, proporcionando oferta acrescida de capital dirigido a empresas promotoras da transição. O seu papel pode ser ampliado, no sentido em que os fundos podem influenciar as estratégias das empresas, exercendo pressão sobre as suas decisões enquanto acionistas interventivos. O peso dos fundos sustentáveis é, contudo, limitado: da amostra de ativos sob gestão analisada, num total de 49 biliões de dólares no final de 2020, fundos sustentáveis geriam valores de 3,6 biliões de USD e fundos ambientais totalizavam 130 mil milhões de USD. Todavia, a mudança em curso é representativa: em 2020, os ativos sob gestão de fundos ambientais cresceram 48% face ao ano anterior. Acresce que os fundos convencionais têm igualmente refletido nas suas estratégias de investimento a preocupação crescente com considerações ambientais, sociais e de governação. Não obstante estes progressos, as emissões mundiais de dívida verde terão atingido em 2021, à data, 360 mil milhões de USD1 (face a 300 mil milhões no total de 2020) para um saldo vivo de 1,4 biliões de USD2. Um dos obstáculos ao desenvolvimento deste mercado é a falta de dados. Por essa razão, as autoridades, com destaque para a Comissão Europeia, têm desenvolvido esforços com vista à criação de uma arquitetura global de informação sobre clima (dados, divulgação de informação, taxonomia, …) para emitentes e investidores e assegurar supervisão e vigilância para evitar branqueamento ecológico (greenwashing). Em julho de 2021, a Comissão Europeia atualizou e alargou as suas propostas através da publicação da “Strategy for financing the transition to a sustainable economy”, com o objetivo de tornar a União Europeia líder global na definição de referenciais e normas relativos ao financiamento sustentável. Antes disso, em junho de 2020, foi adotado o Regulamento Taxonomia, preenchendo a lacuna de inexistência de classificadores universais de atividades ecológicas. No campo dos instrumentos disponíveis para desenvolvimento de soluções de investimento sustentável, o Regulamento de índices de referência da UE para a transição climática entrou em vigor em abril de 2020 e, em julho deste ano, foi apresentada a proposta de padrão normativo das emissões verdes europeias (EUGB). Relativamente à obrigação de transparência e a necessidade de criação de um regime de divulgação de informação, encontra-se em vigor desde março deste ano o Regulamento de Divulgação de Informações sobre a Sustentabilidade dos Serviços Financeiros (SFDR) e, em abril passado, a Comissão Europeia divulgou a proposta de Diretiva de Divulgação de Informações Não Financeiras (CSDR). O branqueamento ecológico é um risco seriamente encarado pelos investidores profissionais. Estes mostram-se muito exigentes na busca de evidência de cumprimento das promessas de alocação e impacto do uso dos fundos. A validação dos compromissos ambientais pode passar pela construção de indicadores detalhados, obrigando à recolha de dados diários por helicópteros ou drones de áreas de floresta tropical, dimensão de centrais fotovoltaicas, níveis de água em albufeiras,… O incumprimento do dever de informação ou desconformidade com classificação de atividades pode conduzir à ostracização do emitente ou gestor de ativos. O progresso do mercado de capitais (e das economias) radica na interiorização que sustentabilidade significa valor aportado à sociedade, no mínimo por via de identificação e mitigação de riscos ambientais, sociais e de governação. Por conseguinte, onde se investe as poupanças conta para o futuro do planeta. Os reembolsos totais de dívida italiana nos próximos doze meses atingem 362 mil milhões de euros.