Dinheiro Vivo Online Denúncia. Depois da construção, a engenharia. Estado impõe redução dos custos dos contratos e as empresas “fazem qualquer coisa” para ganhar obras. O esmagamento de preços, que levou ao desaparecimento de inúmeras construtoras, chegou, também, aos serviços de engenharia e ambiente e está a criar desemprego e pôr em causa a sobrevivência das empresas. A denúncia é da Luságua, que fala em destruição de valor e degradação da qualidade. A Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente lamenta a falta de coragem para “adjudicar pelo preço certo” e aponta o dedo ao Estado, já que a Águas de Portugal (AdP) atua sobre 50% do mercado. O Governo não reage e a AdP também não. “O vírus da crise da construção acabou por nos afetar, também, muito incentivado pelo próprio Estado que definiu, ainda no tempo da troika , que os novos contratos teriam de ser reduzidos em 10% do seu valor. E as empresas, para manter um portefólio de produtos e serviços, entraram nessa loucura”, explica Carlos Rodrigues, administrador da Luságua, que enviou uma carta ao presidente do grupo Águas de Portugal alertando para a fixação de preços base nos concursos “claramente insuficientes” para cobrir os custos de exploração e de investimento. No imediato, garante este responsável, esta política tem levado à redução de vencimentos e ao despedimento de quadros, com consequências na “degradação da cadeia de valor” das empresas. Mas o Estado também perde: “Há uma otimização de custos, mas o serviço é prestado de pior forma, garante. Sem resposta da Águas de Portugal, Carlos Rodrigues entregou cópia da carta ao secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, mas não recebeu, também, qualquer comentário. O Dinheiro Vivo questionou o Ministério do Ambiente sobre a matéria, mas sem sucesso, igualmente. Tal como não obteve resposta da Águas de Portugal. O objetivo da Luságua é que o Governo tivesse esta questão do esmagamento de preços em consideração, antes da entrada em vigor do novo Código dos Contratos Público. Carlos Rodrigues teme que o novo código, que entrou em vigor a 1 de janeiro, “venha agravar mais a situação, dando, ainda, mais importância ao fator preço nos concursos públicos”. Francisco Machado, presidente da AEPSA Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente, fala numa “degradação gigantesca” dos preços nos concursos, mas acredita que o novo código poderá vir a ser uma mais-valia no combate aos preços anormalmente baixos. O problema, acredita, está na “falta de coragem” dos donos de obras em “adjudicar pelo preço certo”, preferindo “adjudicar não importa como”. E o Governo, garante, “tem grandes responsabilidades na matéria, na medida em que tutela a Águas de Portugal que atua sobre 50% do mercado”. Mas Francisco Machado aponta, também, o dedo às empresas: “Por falta de mercado e de oportunidades, fazem seja o que for para ganhar contratos, e, depois, porque têm de reduzir os custos ao máximo, substituem quadros com conhecimento por pessoas baratas, por estagiários. E isso reflete-se na qualidade do serviço prestado e na degradação progressiva dos recursos humanos, porque não há forma de reter o know how . É tudo medíocre, vamos perdendo a nossa qualidade e a nossa competitividade no mercado global”, lamenta, desafiando as empresas a terem “mais consciência social”. No limite, é a própria saúde económica do país que pode estar em causa. “Destruímos valor nas empresas nacionais e acabamos a importar serviços de empresas internacionais”, lamenta Carlos Rodrigues. Mas não só. A própria competitividade internacional das empresas portugueses é prejudicada por esta via. “Os concursos internacionais estão assentes nestas âncoras que são os contratos em território nacional e na qualidade dos seus técnicos. Quanto maior é o contrato no exterior, mais apertados são os requisitos técnicos. E se não conseguirmos fixar os nossos quadros, não conseguimos concorrer. E vamos morrendo todos aos bocadinhos”, diz.