Capital Verde
Empresas que gerem os aterros avisam que a duplicação da taxa de gestão de resíduos pode também desincentivar a reciclagem do plástico, tornando mais caro o seu envio para centros de triagem.
O aumento da taxa de gestão de resíduos para o dobro — 22 euros por tonelada — já a partir de setembro, como anunciou o Governo, poderá desincentivar a reciclagem do plástico, com impacto na emissão de CO2 para a atmosfera, avisa a AEPSA – Associação das Empresas Portuguesas do Setor do Ambiente. Para as famílias, poderá resultar numa subida até 5% na fatura da água.
A associação está contra a decisão do Governo de duplicar o valor da TGR “num momento de forte pressão da atividade económica, sabendo que um aumento de 100% desta taxa terá implicações diretas quer no agravamento de custos para a atividade das empresas, quer para os consumidores, no atual cenário de dificuldade das famílias“.
A AEPSA diz que o aumento da taxa poderá encarecer em cerca de 4% a 5% na fatura da água — que agrega os serviços de água, saneamento e resíduos — dos clientes domésticos. Para os clientes industriais, este aumento “representaria um agravamento dos custos de tratamento de resíduos na ordem de 15% a 20%, o que neste contexto de pandemia seria insustentável para a competitividade da indústria. Seria, sem dúvida, mais um elemento catalisador da asfixia financeira das empresas”.
“Por outro lado, e a título de exemplo, um aumento da taxa, por si só, pode desincentivar a reciclagem do plástico – tornando mais caro o seu envio para centros de triagem, torna-o mais barato para queima — com o consequente impacto na emissão de CO2 para a atmosfera”, disse ao ECO/Capital Verde Eduardo Marques, presidente da direção da AEPSA, pedindo um aumento gradual da taxa de gestão de resíduos.
De acordo com os números da associação, de 2018, em Portugal foram produzidos 10,6 milhões de toneladas de resíduos industriais (não urbanos) ou seja, o dobro dos 5,4 milhões de resíduos urbanos produzidos. “Aproximadamente 84% destes resíduos industriais foram reciclados, uma taxa muito superior à alcançada nos resíduos urbanos e que ronda, na melhor das hipóteses, os 35% – e os restantes 10 a 15% foram, maioritariamente, tratados por deposição em aterro”, frisa a AEPSA.
A pedido do PCP, BE e PSD, o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, regressa esta quarta-feira à Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território para uma audição sobre a situação dos aterros de Valongo e Azambuja. Isto depois de na semana passada os presidentes das câmaras municipais da Azambuja e de Valongo terem estado na mesma comissão a pedir o encerramento dos aterros situados nos seus territórios, geridos pelas empresas Triaza e Recivalongo, respetivamente.
Para julho o Governo prometeu já a apresentação de um novo Plano de Ação de Aterros 2020 e em setembro a taxa de gestão de resíduos vai aumentar para o dobro – 22 euros por tonelada – para travar a deposição em aterro.
Com o aumento do volume de resíduos contaminados, por causa da pandemia de Covid-19, e a importação de lixo proveniente de outros países europeus, como a Itália, por exemplo, o debate está instalado, com o Governo a travar a fundo e a suspender a importação de resíduos para Portugal, até ao final do ano e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) a identificar como desafio a “redução da deposição em aterro até 10%”. Sobre o Plano de Ação de Aterros 2020, o presidente da APA referiu já numa audição, por videoconferência, na comissão parlamentar de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, na Assembleia da República que estão previstas 76 ações de fiscalização e inspeção aos aterros de resíduos.
Do lado de quem gere os aterros, a AEPSA – Associação das Empresas Portuguesas do Setor do Ambiente já fez saber a sua posição e fala de um “incompreensível movimento recente de crítica aos aterros de resíduos não perigosos, não urbanos”. “As entidades licenciadas para esta atividade têm demonstrado cumprir todos requisitos legais das rigorosas normas definidas a nível nacional e internacional”, disse ao ECO/Capital Verde Eduardo Marques, presidente da direção da AEPSA, sublinhando que o próprio presidente da APA, Nuno Lacasta, disse aos deputados que “os aterros são infraestruturas indispensáveis, e se não existissem o problema ambiental e de saúde pública agravar-se-ia”.
A AEPSA considera que os aterros de resíduos são “instrumentos fundamentais para a implementação e manutenção de um sistema nacional eficiente de gestão de resíduos. No passado, foram os aterros que permitiram o encerramento das lixeiras em Portugal. Nesta fase de pandemia, voltaram a mostrar que são infraestruturas imprescindíveis para dar resposta ao enorme desafio da gestão de resíduos”.
Além do lixo produzido pelas famílias, também na produção industrial são gerados resíduos, e nem todos podem ser reciclados garante a AEPSA. “Nestas situações, a única alternativa é a solução de deposição em aterro. Neste contexto, sem a existência destas infraestruturas, o tecido industrial não teria solução para assegurar a continuidade da produção industrial, ou teria de exportar esses mesmos resíduos com custos acrescidos”, aponta Eduardo Marques.
De Matos Fernandes, o setor espera no Parlamento “uma justificação objetiva e uma clarificação sobre a estratégia nacional para os resíduos industriais, que demonstre que o recurso à deposição em aterro é parte integrante da solução – e não parte do problema – para gestão de resíduos em Portugal”.
Para a AEPSA, o encerramento de aterros como o da Azambuja ou Valongo “representaria um retrocesso ambiental de décadas. O abandono de resíduos em espaços que não estejam devidamente preparados tecnicamente para o efeito – como pedreiras, descampados ou oceanos – consiste num atentado à saúde pública, à qualidade de vida das pessoas e aos recursos naturais do planeta”.
“Portugal precisa de um setor de resíduos robusto, maduro e capaz de enfrentar os enormes desafios com que hoje nos confrontamos; as novas metas da UE que terão que ser transpostas, já neste mês de Julho; o desafio de um modelo circular de negócios e a retoma da atividade pós pandemia”, remata a AEPSA.