Pacote legislativo esteve aberto a consulta pública em 2015. O relatório dessa consulta data de Fevereiro de 2016 e só muito recentemente foi tornado público. Ministério do Ambiente garante que diploma será aprovado até final de Junho deste ano.
Para resolver “uma importante lacuna” na legislação nacional, e permitir a avaliação da qualidade do solo, a remediação da contaminação de terrenos, e consequente responsabilização, foi colocado em consulta pública um projecto de diploma para solos contaminados. O documento, que chegou a ir a Conselho de Ministros em 2016, pretendia ser “um marco da política do ambiente” quando foi redigido em 2015. Mais de três anos passados, ainda não foi aprovado. O gabinete do ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, diz que “deverá ser aprovado” até final de Junho de 2019 mas não esclareceu o motivo desta demora.
O grupo parlamentar Os Verdes pediu, pelo menos duas vezes ao Governo (em 2017 e em Outubro de 2018), para explicar por que motivos a lei não foi aprovada. Numa resposta de Outubro de 2018, assinada pela chefe de gabinete, o ministro João Pedro Matos Fernandes esclarece que “está em curso a avaliação e a ponderação da proposta” do diploma para que se ponderem “os custos de contexto para as empresas”, “mantendo-se os objectivos que se pretendem acautelar” como “a protecção do ambiente e da saúde humana”.
Os Verdes apelaram ao Governo a publicação “com a maior celeridade possível” de legislação para prevenir a contaminação dos solos. Em cartas e requerimentos, apresentaram a contaminação dos solos como “um problema grave” que representa um potencial “perigo para a saúde pública e para o ambiente”, invocando a necessidade de “uma maior transparência” em “processos desta natureza” e nesse sentido, pedem que lhes seja enviado o relatório da consulta pública, o que não aconteceu pelo menos até à semana passada. O relatório só terá recentemente ficado disponível na página pública do portal Participa.
Também contactado, Rui Berkemeier, especialista em resíduos da associação ambientalista Zero, diz que “essa explicação para a demora da aprovação da lei não foi dada”. No entanto admite que na origem do arrastar deste processo, possam estar “interesses de grandes grupos”, uma vez que a nova legislação “pode ter custos” adicionais de vigilância e avaliação para as empresas de sectores poluentes.
Responsabilidades clarificadas
O diploma assume-se como um instrumento “que clarifica a cadeia de responsabilidade dos diversos intervenientes”, como sejam “o operador actual, anterior ou terceiros envolvidos”. Considera-se “o proprietário do terreno como responsável em última instância, quando for impossível identificar, ou já não existir, o causador da contaminação”. Apenas compete ao Estado intervir “nas situações de perigo iminente para a saúde pública ou para o ambiente, em que não seja possível a aplicação dos princípios do poluidor-pagador ou da responsabilidade”.
De acordo com o projecto de decreto-lei, o proprietário do terreno ou operador da actividade é responsável por fazer uma Avaliação Preliminar do Risco de Contaminação do Solo e, se existir risco, terá depois de realizar uma Avaliação Exploratória da Qualidade do Solo. Consoante os resultados também aqui obtidos, será necessária a realização de uma Avaliação Detalhada da Qualidade do Solo, baseada numa análise de risco.
Numa fase mais avançada, num contexto-limite de “situação de risco inaceitável para a saúde humana ou para o ambiente”, fica “o responsável pela remediação” obrigado a “apresentar, para efeitos de aprovação, um Projecto de Remediação do Solo” e os seus resultados serão monitorizados. Só com os objectivos fixados “alcançados”, prevê o projecto de diploma, seria emitido um Certificado da Qualidade do Solo.
A iniciativa, do tempo do anterior Governo, prosseguiu com o actual, que tomou posse em Novembro de 2015. A consulta pública do projecto de decreto-lei, que terminou nesse mesmo mês de Novembro, junta dezenas de contributos analisados num relatório com data de Fevereiro de 2016.
O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, chegou a dizer que até o fim desse ano [2016] o diploma estaria “aprovado”. Na altura, uma reportagem da revista Visão sobre a descoberta de solos contaminados no terreno da antiga refinaria de Cabo Ruivo onde o grupo José de Mello Saúde iniciara obras para a construção de um parque de estacionamento subterrâneo, pôs em evidência o vazio legal em Portugal que permita prevenir e remediar situações de solos contaminados.
O diploma, que ficou na gaveta, prevê a criação do Atlas da Qualidade do Solo, um documento destinado a informar o público “sobre os locais contaminados e remediados, as actividades potencialmente contaminantes e as técnicas de limpeza adoptadas”.
A legislação, a ser aprovada ainda este ano, como garante ao PÚBLICO o ministério do Ambiente, determina, na sua forma original, que o proprietário de terrenos é responsável pelas avaliações da qualidade do solo, antes da eventual venda. O relatório da consulta pública refere, porém, que “foi clarificada a assunção” dessa responsabilidade por parte do comprador do terreno “no momento da escritura”, e ainda que essa responsabilidade “pode ser assegurada pelo adquirente não podendo este, em conformidade, alegar exclusão de responsabilidade.”