Expresso Concessão a privados ”não é inevitável”.Governo passou quase dois anos a dizer que pretendia concessionar o sector das águas a privados. Mas, agora, a prudência parece ter chegado ao Executivo, por via do novo ministro do Ambiente. “A concessão a privados é uma possibilidade e não uma inevitabilidade”, afirmou Jorge Moreira da Silva, em entrevista ao Expresso, indicando que, antes de mais, há que concluir a restruturação do sector. Esta passa pela agregação dos 19 sistemas ‘em alta’ (que captam e levam água até aos municípios ou retiram destes as águas residuais) do grupo Águas de Portugal (AdP) em apenas quatro, em busca de maior harmonia tarifária, eficiência e redução de custos; e pela fusão dos sistemas ‘em baixa’ (que distribuem a água ou retiram os esgotos nos dos municípios) para criar economias de escala. Esta reorganização deverá estar concluída até ao final da legislatura, e só depois será tomada uma decisão sobre “a eventual concessão a privados”, assume o ministro. E questiona: “Se no final deste processo tivermos empresas com um nível de sustentabilidade económica e financeira como o da EPAL, que razão haverá de tornar inevitável a concessão?”. Ou seja, a gestão pode permanecer na esfera pública. Aliás, “a tendência internacional é a de ‘resgates’ de concessões em grandes cidades e sistemas”, indica Rui Godinho, que preside à Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas (APDA). “Berlim, Paris ou Buenos Aires são exemplos” dessa remunicipalização ou renacionalização, refere o especialista. Godinho considera “sensata” a posição do ministro do Ambiente e lembra que, “recentemente, o comissário europeu Michel Barnier disse que iria propor a retirada do sector da água da proposta da Diretiva Concessões”.Por seu lado, Diogo Faria de Oliveira, que preside à Associação das Empresas Portuguesas para o Sector do Ambiente (AEPSA) e à Aquapor, afirma que “é importante uma definição rápida do Governo sobre o que quer fazer com as concessões e subconcessões, porque isso permite aos investidores privados e à banca tomarem uma decisão”.Holanda vs InglaterraJá Francisco Nunes Correia, ex-ministro do Ambiente, frisa que “a prudência do atual ministro é positiva”, perante a realidade mundial. O presidente da Parceria Portuguesa para a Água considera que “só daqui a 10 ou 15 anos é que se pode falar em privatização, ainda estamos na fase das infraestruturas”. E menciona o caso holandês, onde “um governo liberal e de centro-direita decidiu manter o sector do lado público”. Na Holanda os serviços de águas são sempre prestados por entidades públicas, apesar de regidas por direito privado e recorrerem a outsourcing na construção e exploração. A produção e a distribuição estão nas mãos de 10 entidades públicas e as águas residuais nas dos municípios. É um modelo que revela eficiência, já que as perdas de água na rede são inferiores a 10%, mas que não recupera os custos. “Tenho de concordar que a questão da gestão eficiente não depende de ser público ou privado, mas sim de uma gestão profissional”, admite Faria de Oliveira.No campo oposto está o modelo aplicado em Inglaterra e no País de Gales, totalmente na mão de privados. Margaret Thatcher vendeu tudo, até as in- fraestruturas, para ter o sector privado a investir na construção e reabilitação de condutas ou estações de tratamento e obter eficiência. No entanto, as perdas na rede estão acima de 20% e o preço da água subiu mais de 50% desde 1989. E, recentemente, o regulador inglês teve de intervir para bloquear nova subida de preços, já que o investimento devido não estava a ser feito.”Um regulador independente e com meios para agir é essencial”, sublinha Pedro Serra, ex-presidente da AdP, lembrando que “a entidade reguladora (ERSAR) está debilitada e sem meios”. A ERSAR continua a aguardar a aprovação parlamentar da nova lei orgânica. Segundo Moreira da Silva, tal deverá acontecer “até dezembro”. Perante as dificuldades do regulador, que também enfrenta reduções orçamentais, o ministro salienta a sua “grande capacidade técnica”. Mas admite que “uma regulação independente” é essencial para que as situações de monopólio nas águas não se tornem um problema. Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.